Mais de 289 famílias moçambicanas reassentadas em Cateme, 25 de Setembro, 5º bairro e as que tiveram “indeminização assistida” pela mineradora brasileira Vale Moçambique, em Moatize, na província de Tete, bloquearam, na manhã desta segunda-feira (23), pelo menos um dos acessos à mina daquela empresa exigindo que lhes seja pago o valor remanescente referente à sua compensação, em virtude da perda das terras onde tinham as suas residências e tiravam a sua principal fonte de rendimento com recurso à fabricação de tijolos à base de argila. O bloqueio, que se estendeu a linha férrea, voltou a acontecer nesta terça-feira (24).
No acesso em alusão à mina da Vale – cancela da estrada de Chipanga e a estrada de Capanga – foram colocadas barricadas e um grupo numeroso de oleiros pernoitou no local com vista a garantir que nenhum comboio sairia dali transportando carvão para o Porto da Beira. Até este momento ainda não há notícias de uma intervenção exacerbada por parte da Polícia, a qual foi solicitada para amainar os ânimos.
Dos oleiros, dos quais alguns foram detidos (Refo Agostinho Estanilau, por exemplo), em Abril deste ano, quando enveredaram pela mesma via para exigir a observância dos seus direitos pela Vale, faz parte, também, um grupo de camponeses que se queixa de ter sido enganada pela mineradora, uma vez que as suas machambas foram ocupadas sem em contrapartida serem indemnizadas.
Segundo apurou a Acção Académica para o Desenvolvimento das Comunidades Rurais (ADECRU) a manifestação dos oleiros estava comunicada às autoridades locais: “a empresa Vale Moçambique, por não honrar com o seu compromisso e desprezando o Governo Local de acordo com o despacho exarado no dia 29/10/2013, pela Sua Excelência Sr. Governador da Província de Tete, para indemnização definitiva das machambas, a comunidade do Reassentamento 25 de Setembro e da indemnização assistida, vêm por meio desta informar as entidades acima transcritas, que no dia 23/12/2013, faremos uma reivindicação até aos Escritórios da Empresa Vale Moçambique, exigindo os valores em causa.”
Vicente Adriando, membro da ADECRU, explicou-nos que, enquanto os oleiros queixam-se de de ter recebido apenas 60 mil meticais de compensação, dos 90 mil a que eles tinham direito, alguns camponeses queixam-se de não ter auferido ainda nenhum valor pela perda das suas terras, onde, neste momento há um entulho colocado pela Vale como forma de impedir que se realize alguma actividade agrícola. Os camponeses reclamam uma indeminização de 119.250 meticais por hectare.
Tratam-se da machambas de localizavam nas comunidades de Bwaminga, Chidwe, Mithethe, Nhacolo, Chileca, Tchenga, Nyankhumba, Kantondo, Kalawile, Khandwe, Katete, Ngulowale, dentre outras. Segundo Vicente Adriano, a Vale diz que já não tem nada a tratar com os oleiros nem com o governo local porque o assunto foi e está a ser tratado pela firma com o Governo Central. Aliás, o executivo local não tem competência para dirimir o caso, de acordo com a mineradora.
“A Vale diz que não recebe ordens do Governo Distrital e nem Provincial porque o seu contrato de exploração mineira foi assinado em Maputo pelo Governo Central. Ao nosso ver estes problemas resultam porque as pessoas responsáveis pelo reassentamento não são de Tete, vieram de fora e não são sensíveis aos nossos problemas, não nos olham como pessoas”, disse à ADECRU um dos lesados presente do bloqueio da estrada feito em Capanga.
“Tinha a minha machamba em Nhacolo, comecei a produzir em 1992 e plantava milho, amendoim, mapira, feijão nhemba…hoje sou reassentada do Bairo 25 de Setembro e sou obrigada a comprar alimentos com o pouco dinheiro que o meu esposo consegue de ganhu-ganhu (trabalho sazonal)…os brasileiros e esse nosso Governo só nos trouxeram desgraça, levaram-nos a machamba, o único meio que a minha família tinha para sobreviver”, disse também à ADECRU uma idosa com um semblante de desespero e abandono.
Entretanto, a Vale, sem se predispor ao diálogo com os lesados, diz que não tem nenhuma dívida com os oleiros nem machambeiros, muito menos com as famílias que receberam casas consideradas de má qualidade. Refira-se que em Julho deste ano, os oleiros o Tribunal Judicial Distrito de Moatize iniciou o julgamento do “Caso Oleiros de Moatize”, em que o grupo a que nos referimos, pretende, através da Justiça, forçar a mineradora a aumentar o valor das compensações pela perda das suas terras. O processo que leva o número 13/2013, está nas mãos do juiz António Monteiro.
Nas primeiras audições, o governador de Tete, Ratxide Gogo, saiu em defesa da Vale Moçambique ao alegar que as famílias que consideram lesadas ou enganadas pela empresa em causa estavam a fazer exigências infundadas porque já haviam recebidos as suas indemnizações há quatro anos e, nessa altura, o valor não era irrisório tal como as mesmas defendem agora.
Todavia, na altura, o advogado dos oleiros, Hermínio Nhantumbo, explicou, em sede do tribunal, que os 60 mil meticais recebidos pelos oleiros não constituíam nenhuma indemnização até porque nunca houve acordo nesse sentido.