O presidente americano, Barack Obama, começa esta semana sua jornada pelo coração do mundo árabe, no primeiro movimento direto da delicada tarefa que se impôs de limpar a imagem dos Estados Unidos entre os povos muçulmanos.
Chegando ao Egito na quinta-feira, Obama fará um discurso dirigido aos muçulmanos do mundo, aproveitando seus próprios laços ancestrais com o islã e globalizando a mensagem de mudança que uniu milhões em torno de seu projeto político. A viagem de Obama por Egito e Arábia Saudita, no Oriente Médio, na próxima semana, acontece, segundo analistas, num momento em que uma oportunidade de avanço surge na complicada crise perpétua que assola a região.
O presidente americano também irá à França e à Alemanha, onde participará de cerimônias comemorativas do fim da Segunda Guerra Mundial. Outros, no entanto, enxergam perigo na atitude de Obama, que tem ressaltado suas discordâncias com o atual governo de Israel, ao mesmo tempo em que diminuem as esperanças de uma luz no fim do túnel para a questão nuclear iraniana. Obama dará destaque a uma reconciliação com o mundo islâmico e o estabelecimento de uma diplomacia fortalecida no Oriente Médio, conforme o prometido durante os meses de campanha presidencial. “Com o mundo árabe, procuramos um novo caminho para avançar, baseado no interesse e no respeito mútuos”, disse Obama em janeiro, ao discursar em sua posse.
Desde que chegou à Casa Branca, Obama já conversou com o líder palestino Mahmud Abbas, por exemplo, além de dar uma entrevista à rede de televisão árabe Al-Arabiya. No parlamento turco, onde fez um discurso sem precedentes dirigido principalmente ao povo iraniano, Obama afirmou ao mundo árabe que os Estados Unidos não estão em guerra com o islã. A primeira parada da viagem de Obama, na quarta-feira, será na Arábia Saudita, onde se encontrará com o rei Abdullah em busca de apoio para os esforços americanos pela paz na conturbada região.
Mas o momento mais esperado do giro presidencial será o discurso de Obama na Universidade do Cairo, organizado em parceria com a Universidade Al-Azhar, tradicional centro de estudos islâmicos. Obama pode tentar usar a retórica carismática que o ajudou a eleger-se presidente como um bálsamo para a desconfiança generalizada da região em relação aos Estados Unidos. “Quero aproveitar a ocasião para levar uma mensagem mais ampla sobre como os Estados Unidos podem mudar para melhor seu relacionamento com o mundo muçulmano”, indicou o presidente na semana passada.
O discurso do Cairo representará também o cumprimento de uma promessa, feita ainda durante a campanha, quando Obama disse que falaria em um fórum majoritariamente islâmico. Obama deve mencionar fatos de sua exótica biografia em uma narrativa política, como fez em um discurso de 2008 no qual falou sobre a questão das raças.
No Egito, o presidente americano deve se referir à fé islâmica de seus ancestrais paternos, no Quênia, assim como ao tempo que passou na Indonésia quando criança e ao contato que manteve com comunidades islâmicas no Illinois, estado pelo qual se elegeu senador. “O presidente experimentou o islã ele mesmo em três continentes antes que fosse capaz, de fato, de visitar o coração do mundo árabe”, declarou o assessor de política externa Denis McDonough.
Alguns analistas acreditam que Obama pode estar se precipitando neste gesto. “As expectativas na região estão muito altas, e eu acho que existe uma grande chance de que estas expectativas sejam frustradas”, estimou Flynt Leverett, que trabalhou na administração do ex-presidente George W. Bush, mas pediu demissão por discordar de suas políticas para o Oriente Médio. “Acho que as pessoas estão procurando por isso, estar no local onde ele aordará a questão palestina”, acrescentou. “Ficarei surpreso se ele realmente fizer isso”. Uma pesquisa feita pelo site WorldPublicOpinion.org, ligado à Universidade de Maryland, revelou que apenas 4% dos egípcios têm uma visão favorável sobre o governo americano, de acordo com dados coletados em agosto de 2008, quando Bush ainda estava no poder.
Outra pesquisa, feita pela McClatchy/Ipsos este mês, indica que apenas 33% das pessoas entrevistadas em seis países árabes têm uma opinião favorável dos Estados Unidos. Obama, no entanto, pode ser o mensageiro ideal para mudar este quadro: sua aprovação chega a 26% no Kwait, 22% na Jordânia, 18% nos Emirados Árabes Unidos, 15% na Arábia Saudita, 13% no Egito e 11% no Líbano.
Alguns especialistas, no entanto, mantêm o ceticismo. “Não há nada que Barack Obama possa dizer aos muçulmanos no dia 4 de junho para tornar os Estados Unidos populares, e ele não deveria tentar”, comentou Jon Alterman, do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. “Os interesses prioritários (dos EUA) simplesmente não estão aliados às políticas que muitos muçulmanos em todo o mundo gostariam de ver os Estados Unidos aplicarem”, acrescentou. “Vamos ter que concordar em discordar, e esta será a primeira missão do presidente – enquadrar a política americana de uma maneira que a hostilidade generalizada em relação aos Estados Unidos perca um pouco da paixão”, concluiu.