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EDITORIAL: O país da Renamo

Um Estado que se quer de Direito Democrático não se deve permitir ao luxo de ter um exército paralelo ao oficial. Aquilo (o exército de Afonso Dhlakama) é uma aberração, independentemente do que diz ou não o Acordo Geral de Paz.

O Estado devia, há muito, desarmar os homens daquela formação política. Mantendo-os armados, mantém-se também um potencial para a guerra. Até porque a Renamo, já se sabe, usa a sua rica história militar para procurar protagonismo político.

Não obstante ter-se alcançado a estabilidade política, económica e social depois de uma violenta guerra civil e uma falhada experiência económica socialista, Moçambique ainda é um país extremamente empobrecido e, com as histórias que nos chegam da capital do norte, onde mais 400 ex-guerrilheiros daquela força política se encontram, corre-se o risco de mergulharmos numa situação deplorável sem precedentes à semelhança de outras nações africanas.

No fundo, a Renamo não está interessada numa instabilidade política e muito menos em tomar as rédeas do poder. Pelo contrário, o que se passa em Nampula não é mais do que o reflexo de um partido politicamente fragilizado com uma horda de seguidores desocupados.

Porém, o que espanta nessa história, que se assemelha a um roteiro de uma telenovela mexicana, é a indiferença, o descaso e a inércia do Estado e do Governo. Até porque se fosse o caso de um grupo de moçambicanos empobrecidos por qualquer megaprojecto desta pátria de heróis a reivindicarem os seus legítimos direitos, o Estado moveria céus e terras para silenciar e reprimir cidadãos tão indefesos.

Aliás, muniria até aos dentes a polícia e toda a sua divisão para amedrontarem a população de modo a permanecer no mais parvo mutismo. Ou seja, desde que a população não expresse livremente os seus direitos pode aparecer um acéfalo qualquer armado até aos dentes.

Assim, qualquer criminoso que tenha duas armas percebe que o Estado está capturado pela vontade de qualquer senil. Não vale, portanto, a desculpa de que se trata de uma manifestação de charme de Afonso Dlhakama. O país, diga-se, é muito mais importante do que ele. Ou seja, 22 milhões de moçambicanos não podem, de forma nenhuma, ser privados de viver por causa dos problemas de personalidade de uma pessoa que quer trazer o mato para o meio urbano.

É absurdo que quando é a população desarmada e desprotegida que vai à rua reclamar o preço do pão, o Governo responda com balas verdadeiras e quando um homem que caiu em descrédito procura protagonismo militarizando uma cidade, o Governo fala de negociações e pede às organizações da sociedade civil para mediarem a libertação de um homem feito refém.

O homem que está sob custódiados homens armados da Renamo merece a protecção do Estado, independentemente do que ele tenha feito. Afinal, não é este Governo que desaconselha o povo de recorrer à justiça pelas próprias mãos?

Que estatuto têm aqueles homens que povoaram a Rua dos Sem Medo para se permitirem o direito de manter sob cárcere privado um cidadão? Este é um problema cuja resolução o Governo sempre protelou e hoje pode resvalar para uma situação muito complexa. O direito que Dhlakama tem de se manifestar não deve pôr em causa o direito que os outros moçambicanos têm de circular livremente.

O direito que Dhlakama tem termina onde começam os direitos das outras pessoas. O desentendimento entre um partido e outro que governa não deve implicar o sacrifício de vidas humanas. Desarmar a Renamo é um imperativo nacional.

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