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O novo Zimbabwe

No bairro 5, precisamente nos arredores da Feira Popular de Manica (FEPOM), cidadãs zimbabweanas e moçambicanas, em menor número, fazem do sexo um meio para conseguir sobreviver. Ou seja, de dia ou de noite, a prostituição é uma realidade em Chimoio. Os carros param e as prostitutas entram, sem medo e com destino incerto.

A poucos dias de terminar o VI Festival Nacional de Cultura, nos arredores da FEPOM caras desconhecidas enchem as ruas em busca de presentes. No bairro 5, as senhoras e jovens que lá vagueiam têm o rosto a nu, familiar aos muitos que conhecem a zona e que as procuram mais nesta época.

Três prostitutas de rua dão a voz pela prostituição no bairro 5. Preferem trabalhar durante o dia porque têm medo dos perigos que a noite pode trazer. Luísa* tem 32 anos de idade e passou mais de metade da vida a prostituir-se. As palavras saem cruas, sem receio, a não ser do incerto de uma vida feita entre becos e calçadas. Veio de Harare há duas semanas porque sabia, diz, que a cidade de Chimoio, nesta época, estaria repleta de potenciais clientes. Luísa sabe que, aos 32 anos, está à beira da reforma. É que “a carne não dura sempre”. “Às vezes os clientes levam-nos e depois não pagam pelo serviço”, confessa. “Mania dos moçambicanos”, acrescenta. Para obrigar os clientes a pagarem, Luísa tem uma receita infalível: “As mulheres de rua deviam estar numa casa. E o cliente procurava a mulher, o que queria, e pagava o seu devido valor”.

Gracinda* tem 28 anos de idade, perdeu o emprego com a crise no Zimbabwe e começou a prostituir-se em Machipanda. Já esteve presa. Não gosta do que faz e queria arranjar um emprego “normal”, mas confessa que não tem “outro modo de vida”. A família “lá no Zimbabwe” sabe o que faz e, apesar de ter sofrido muito no início, “todos acabaram por se conformar”.

“Uma anciã prostituta”

Catarina Maquil*, de 56 anos de idade, fala abertamente sobre os perigos da prostituição. “Uma vez, um cliente apontou-me a pistola à cabeça dentro do quarto. Disse que não me fazia mal, mas fiquei sempre com medo”. Catarina já é avó e o seu desejo é sair da prostituição para que o neto um dia possa conhecer uma mulher diferente daquela que o filho dela conheceu. “Quero ter um emprego e sobreviver sem que seja pela prostituição, pois o meu neto está a crescer e não quero que ele descubra o que faço como aconteceu com o meu filho”, afirma.

Com mais de duas décadas de rua, Catarina trabalha para o agregado familiar. O marido abandonou-a quando descobriu que estava grávida, a nora está desempregada e o filho aufere o salário mínimo. “Há muitos moçambicanos que ainda não aceitam a actividade e isto tão cedo não vai mudar”, reflecte. Não consegue contar as vezes que foi discriminada – esconde a sua vida para não ser alvo de represálias.

Preservativo: sim ou não?

Ao contrário de outras profissionais do sexo com quem @Verdade falou, Catarina diz que nunca pratica relações sexuais sem a utilização de preservativo (já recebeu propostas para o fazer). Apesar do uso de contraceptivos ser uma questão que as incomoda, Gracinda e Luísa partilham uma opinião diferente de Catarina. “Às vezes uso, mas outras vezes não”, refere Gracinda e Luísa acrescenta: “Também podemos ficar doentes com o preservativo e lembrem-se de que a ocasião faz o ladrão. Na verdade, nesta profissão, estamos nas mãos de Deus.”

São três mulheres que se prostituem devido à força da necessidade, que muitas vezes faz com que os sonhos sejam adiados. Como o de Luísa, que confessa, em tom tímido: “Se pudesse sair da rua, gostaria de cumprir o sonho de ser advogada”.

A bela Sofia

Sofia* é o nome de uma mulher que se prostitui noite após noite no bairro 5. Veio para Moçambique em busca de trabalho e acabou a prostituir-se nas ruas de Chimoio. Antes tinha estado no país vizinho. “Na Zâmbia pagam melhor, mas é muito difícil: você tem que se meter em drogas. E a única droga que eu uso é o meu cigarro. Dinheiro é bom, maravilhoso, mas se você se envolver com drogas acabou com a sua vida. Então prefiro ganhar menos”, conta Sofia, de 27 anos de idade.

Pedimos-lhe para designar a sua actividade. Diz que é “garota de programa, zimbabweana e ‘tira’-stress”. Esclarece que o emprego do termo “zimbabweana” não é mais do que uma metáfora utilizada muitas vezes pelos clientes para se referirem à actividade sexual de uma forma mais camuflada. No meio de uma rotina que começa por volta das seis da tarde e que, por vezes, se prolonga até o nascer do sol, há ainda espaço para as relações pessoais. “Tenho namorado. Lá no Zimbabwe fui casada – três relacionamentos sérios, um de três, um de dois e um de 11 meses. Morando na mesma casa, uma vida de casal, normal.”

Diz que o maior preconceito que sofre, além de ser prostituta, é o de ser natural do Zimbabwe. Na rua, os perigos e o preço a pagar por uma vida à margem da sociedade são maiores, explica. “Os moçambicanos não gostam de pagar pelo serviço. A polícia ajuda a aumentar mais essa insegurança, acrescentando que “também temos de trabalhar para a polícia. À noite eles vêm e levam todo o dinheiro que juntamos.”

Sofia diz que é prostituta “de livre e espontânea vontade, não foi através de influência, nem foi por intermediário de ninguém”. Diz ter um relacionamento pacífico com as prostitutas moçambicanas. “Não tem problema. Cada uma fica no seu sítio”. Sofia não é uma prostituta qualquer: vive num cubículo com dois metros quadrados, um lugar que é quarto e sala, mas também escritório. Ela recebe os seus clientes no mesmo leito onde, quando o dia clareia, se procura esquecer deles. Os rostos vêm e vão, diz, os órgãos sexuais variam de tamanho, mas Sofia fica porque não tem para onde ir. Aliás, não tem arte nem engenho para deixar de ser um depósito de esperma.

Três qualidades = três tabelas de preço

Quando anoitece no bairro 5 o grosso das prostitutas sai à rua. Na verdade, são três ruelas que dão corpo ao negócio: na primeira instalam-se, diga-se, as mais caras e supostamente de melhor qualidade; depois temos a segunda liga e, por fim, a terceira. Uma mulher da terceira liga não pode, de forma alguma, ascender à primeira liga. Há entre as prostitutas uma espécie de selecção natural em função da beleza. Ou seja, as que ficam na primeira rua dispõem de atributos físicos e faciais acima de qualquer dúvida. Um ‘shot’ na terceira rua custa 50 meticais; na segunda 100, e na terceira 200.

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