À beira de completar três décadas, Ricardo Mendes –Dino – vai fazer a sua última época no futsal moçambicano. Sente que a paixão começa “a esmorecer” numa altura em que a modalidade clama por “socorro”. Falhou o profissionalismo porque “alguns interesses ou desinteresses obscuros” não lhe deixaram sair do país. Chegou à modalidade pelas mãos de outro craque: Mauro Sales. Não deixou a modalidade porque teve um amigo sempre presente: Mano.
(@Verdade) – Como e onde descobriu a sua paixão pelo futsal?
(Ricardo Mendes) – Descobri essa paixão na zona, na Rua das Flores no bairro Central, ainda bem miúdo. Apesar de vermos muito futebol de 11 pela televisão e ao vivo, não tínhamos muitas hipóteses de praticá-lo pela natureza do espaço físico onde vivíamos.
Na cidade só podíamos jogar no salão, concretamente no da Escola Primária 16 de Junho. Foi nesse local onde dei os meus primeiros toques na bola. Na altura apenas jogávamos futsal de forma recreativa e chamávamos a modalidade simplesmente de futebol de salão. Era bom demais, tínhamos uma equipa fantástica, quase imbatível e divertíamo-nos imenso.
(@V) – Como é que se sentiu quando foi o segundo melhor marcador de um Grand Prix, atrás apenas do melhor jogador de futsal do mundo, o Falcão?
(RM) – Para além do orgulho natural, fiquei surpreendido.
(@V) – Surpreso porquê?
(RM) – Havia 16 equipas se a memória não me trai e nós ficámos em 12º ou 13º lugar. O Brasil ocupou o primeiro lugar, repara nesta distância, e pelo meio competimos com equipas e jogadores com muita qualidade e que disputaram muito mais jogos. Esses é que tinham mais probabilidades de lutar por esse troféu.
(@V) – Como olha para o estágio do futsal em Moçambique?
(RM) – Custa-me falar da modalidade porque neste momento futsal é só a selecção, pelo menos que eu tenha conhecimento. Não há competição interna há ano e meio, o que é lamentável, depois dos passos que esta modalidade tinha dado julgo que recuou bastante. Penso que neste momento a modalidade está a pedir socorro, ela clama por alguém que a salve.
(@V) – Os jogos do futsal já tiveram mais público, mas actualmente essa “procura” baixou drasticamente. O que poderá estar por detrás do rebaixar do entusiasmo?
(RM) – O futsal baixou muito de qualidade, a competição era claramente a Liga Muçulmana contra o Desportivo. Nesses duelos encontrava-se qualidade e, por via disso, também a adesão do público era bem maior. Portanto, a fraca qualidade pode estar a contribuir para a residual afluência, mas também é verdade que os pavilhões e os campos de quase todas as modalidades andam com muitos espaços vazios.
(@V) – Há quem diga que a qualidade dos jogadores baixou drasticamente.
(RM) – Partilho dessa visão, têm surgido pouquíssimos talentos, pelo menos na competição em que estávamos inseridos.
(@V) – Moçambique sempre esteve um escalão acima do futsal angolano, mas parece que agora a situação se inverteu. Como explica a supremacia actual dos angolanos?
(RM) – É um facto. Vi no Grand Prix do ano passado uma Angola muito melhor fisicamente, com jogadores que jogam há algum tempo juntos e muito talentosos. Neste momento estão, confesso, acima de nós e contam com umtreinador que explora ao máximo as qualidades técnicas dos seus jogadores.
(@V) – O futsal poderia estar melhor?
(RM) – Esta deve ser a modalidade mais praticada, pelo menos em Maputo. O futsal devia merecer mais atenção, veja quantos miúdos andam aí pela cidade equipados à procura de um campo para jogar. Existe muita vontade dos praticantes desta modalidade, quer por parte dos miúdos, quer por parte do pessoal que já está em fim de carreira, praticamo-la por amor. Portanto, quem se propôs a mudar a face do futsal que o faça de facto.
(@V) – Sei que teve um proposta da Ucrânia para jogar profissionalmente. O que o impediu de rumar para o profissionalismo?
(RM) – Foi da República Checa. Tive uma proposta para lá ir jogar, mas alguns interesses ou desinteresses obscuros travaram-me no belo Moçambique. Pelo que fiquei a saber no ano passado, no Brasil, do treinador dessa equipa é que eles fizeram tudo o que estava ao seu alcance para que eu fosse jogar no campeonato deles. Devo ter ficado bem por aqui.
(@V) – Qual foi o melhor jogador moçambicano que viu jogar no futsal?
(RM) – Mauro Sales.
(@V) – E o melhor da actualidade?
(RM) – Carlão, do Desportivo.
(@V) – Há alguns meses falou-se de um plano para revitalizar a modalidade. Será que existe vontade?
(RM) -Talvez exista vontade, mas pouco se viu até agora.
(@V) – Nas condições actuais pode surgir um Mauro Sales ou um Madjila no futsal nacional?
(RM) – Não. Talvez da mesma forma que não será possível surgirem jogadores como Chababe, Calton, Ali Hassan e Chiquinho Conde.
(@V) – Ainda sente paixão pelo futsal?
(RM) – A paixão vai esmorecendo, mas ainda tenho a sufi ciente para jogar este ano. Este será omeu último ano de futsal.
(@V) – Depois de todos os títulos que deu à Liga Muçulmana sente, da parte do clube, respeito pelo seu percurso?
(RM) – Realmente dei muito, mas a Liga também me deu muito. Até hoje tenho as portas abertas para qualquer questão. Existe uma relação de respeito mútuo.
(@V) – O investimento da Liga no futebol de 11 e no basquetebol feminino terá, de alguma forma, transformado o futsal numa espécie de parente pobre do clube?
(RM) – A Liga optou por modalidades que lhe dessem maior visibilidade e estas são as modalidades número um e dois no país. Contudo, tenho a certeza de que se se estivesse a jogar futsal a Liga estaria a competir. O futsal está no coração dos dirigentes. Porém, a cabeça manda-os para o negócio do futebol e do basquetebolfeminino.
(@V) – Qual devia ser o lugar do futsal no clube?
(RM) – O lugar que ele merece.
Títulos
3 campeonatos nacionais
4 campeonatos da cidade
3 torneios de abertura
2 taças da cidade 2 vezes melhor jogador do Nacional de futsal 1 vez melhor marcador do Nacional de futsal
1 vez melhor marcador do CAN de futsal
1 vez segundo melhor jogador do CAN de futsal
1 vez segundo melhor marcador do Grand Prix do Brasil