Destacados crentes da religião islâmica distanciaram-se de pronunciamentos feitos, semana passada, na cidade de Nampula, por alguns indivíduos que se identificaram como muçulmanos, os quais incitavam à manifestações de rua em protesto contra a proibição de uso de “burkas” por parte de mulheres desta religião.
A imprensa moçambicana noticiou, nessa altura, que tais elementos, que se identificaram como sendo do Conselho Islâmico de Moçambique, ameaçavam convocar protestos de rua caso o governo continuasse a proibir mulheres muçulmanas de usar a “burka”, uma vestimenta que cobre toda a face da mulher, deixando visíveis apenas os olhos.
A polémica sobre a “burka” despoletou na cidade de Pemba, na província de Cabo Delgado, onde uma estudante duma escola secundária local foi impedida de participar nas aulas por se exibir na escola com esse veste religioso.
O Ministro da Educação, Zeferino Martins, apadrinhado pela sua colega da Justiça, Benvinda Levy, viria a reforçar a medida, considerando ser ilegal tal estudante apresentar-se na escola com esse traje.
A medida destes governantes viola o espírito da laicidade do Estado moçambicano consagrado no artigo 24 da Constituição da República de Moçambique (CRM).
Apesar deste postulado, os crentes muçulmanos por nós contactados em torno do assunto repudiaram os discursos belicosos proferidos pelos seus “irmãos”, sustentando que o diálogo é a melhor forma de se alcançar consensos sobre a matéria que acham que lhes é ofensiva.
Um influente empresário de Nacala, o qual pediu não ser identificado, disse não achar “correcto e humano” que certos indivíduos profiram ameaças em nome da maioria muçulmana, a qual acredita na boa fé do governo em conversar com qualquer estrato da população moçambicana sobre assuntos que a esta diz respeito.
O nosso governo é aberto em conversar com qualquer grupo social moçambicano e sobre qualquer assunto, e penso ser, no mínimo, uma atitude irresponsável lançar ameaças antes de apresentar, formalmente, as preocupações que lhes afligem, observou a fonte.
O nosso interlocutor sustentou, em tom irónico, que o governo moçambicano não tem inimigos, como Bin Laden constituía para a Europa e os EUA, para se preocupar com pessoas que vistam a “burka”.
Há coisas mais importantes que afligem o País com as quais o nosso governo e o Partido Frelimo devem se preocupar, e não com uma simples mulher que cubra a sua face, acrescentou.
Ele desprezou os crentes que velaram essas ameaças, considerando-os de indivíduos oriundos doutras províncias e procuram protagonismos a partir de Nampula, aproveitando- se da grande percentagem de muçulmanos que a província detém ao nível de todo o País.
Por seu turno, Abdul Hamid Satar, um conhecido e respeitado líder muçulmano sunita, disse que se distancia “completamente” desses indivíduos, pois não os conheço, nem os quero conhecer. Ele disse que respeita a opinião do grupo, mas que reprova as ameaças e apelos a actos que atentem contra a vida das pessoas e bens, sendo necessário privilegiar-se o diálogo.
Considerando que os titulares da Educação e da Justiça sobrepuseram-se à CRM, Hamid Satar ajuizou que o País não pode copiar modelos estrangeiros para implementá-los aqui, citando a França, onde a proibição ao uso da burka (véu muçulmano) atinge contornos extremos.
Moçambique está cheio de problemas que precisa de os resolver para o bem do povo, e não pode gastar tempo discutindo esses aspectos mesquinhos, vincou Hamid Satar.
Estes comentários e outros dão indicação de que o grupo não teve mandado de qualquer seita muçulmana para, através da imprensa, apelar à manifestações em protesto contra a proibição de uso da “burka” por mulheres muçulmanas.