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Morreu a escritora solidária

Morreu a escritora solidária

As letras moçambicanas estão de luto desde a tarde da passada segunda-feira, quando a morte foi ao encontro da escritora Lina Magaia na sua casa do bairro do Triunfo, em Maputo. Há cerca de um mês, Magaia sofrera um AVC tendo sido internada de urgência no Instituto do Coração. A casa regressara há uma semana com a saúde muito debilitada. Contava 66 anos.

“Conhecia-a desde os meus 15 anos. Como pessoa sempre se caracterizou por ser uma rapariga muito dinâmica, extremamente consciente e muito lutadora, primeiro pela libertação nacional e depois pelos valores culturais. Fez teatro, cinema, escreveu para os jornais”, refere o professor Calane da Silva instado pelo @ VERDADE a falar sobre Lina Magaia.

E prossegue: “Realizei um filme, “Maputo Mulher”, em que ela entrou como actriz. Teve um desempenho fantástico!” Calane não tem pejo em afirmar que Lina “era uma mulher que punha os pontos nos i, criticava fortemente quando as coisas não lhe agradavam. Possuía também um aspecto que é muito moçambicano: a solidariedade. Estava sempre preocupada com os outros.”

Lina Júlia Francisco Magaia nasceu em Maputo, no ano de 1945. Na juventude, integrou o Núcleo dos Estudantes Secundários Africanos, antes de ir para Portugal com uma bolsa de estudos.

Após ter conhecimento da prisão do irmão Albino, – jornalista recentemente falecido – engajou-se na causa da independência nacional, juntando-se à Frelimo na Tanzânia, já na segunda metade dos anos ´60. Aqui, integrou o Destacamento Feminino das Forças Populares de Libertação de Moçambique, atingindo um lugar de destaque na organização.

Após a independência do país começou a escrever com mais regularidade, sobretudo a partir dos anos ´80 e ´90. O desenvolvimento agrícola foi outra das causas que abraçou com vigor custando-lhe a ‘engolir’ o facto de que um país tão rico agricolamente estivesse tão dependente do exterior.

Insurgiu-se contra a falta de subsídios agrícolas dizendo que “é inconcebível que num país onde se diz que a agricultura é a base do desenvolvimento se recuse a conceder créditos a agricultores, alegando que tal constitui uma operação de risco.”

No primeiro parlamento democraticamente eleito saído das eleições de 1994, onde foi deputada pelo partido Frelimo, Lina Magaia travou duras batalhas pelos direitos humanos, e contra a criminalidade, sugerindo mesmo a necessidade de uma segunda “Operação Produção” para os criminosos.

Antes disso, deu à estampa várias obras como “Duplo Massacre em Moçambique”, “Histórias Trágicas do Banditismo” , “Dumba-Nengue” e “Deletha” que retratam a guerra civil que o país viveu entre 1977 e 1992. “A obra da Lina Magaia deixa- -nos um legado histórico no sentido em que procura trazer toda uma atmosfera político-social que o nosso país viveu um pouco antes da independência até aos anos ´90.

Vale a pena ler sobretudo o “Dumba-Nengue””, refere ao @ VERDADE Lucílio Manjate, professor de literatura comparada da UEM. “Na minha perspectiva é mais um arquivo, no bom sentido de termo, porque permite-nos regressar a esse passado e captar aquilo que foram as angústias da guerra depois da independência.”

Em relação à sua escrita, Manjate considera-a “muito próxima do depoimento.” “Ela não estava muito preocupada em discutir estéticas literárias mas sim em passar pensamentos e ideias que de alguma forma estavam em tensão, em conflito. É uma literatura funcional, que abraça uma causa, engajada nesse sentido. Isto reflecte-se no estilo dela: directo, coloquial, que nunca perde de vista o seu objecto principal que é a informação.”

Ultimamente, com a saúde debilitada, Lina Magaia era pouco vista em público. Uma das suas últimas aparições teve lugar na cerimónia de lançamento da autobiografia do ex-presidente Joaquim Chissano no anfiteatro da universidade “A Politécnica”.

O seu último livro, “Recordações da Vovó Marta”, resultou de uma série de conversas informais com Marta Mbocota Guebuza – mãe do chefe de Estado, Armando Emílio Guebuza. Esta seria a primeira de uma série de biografias que Lina Magaia planeava escrever nos próximos tempos. A doença roubou-lhe os planos.

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