O problema de escassez de água continua a não dar tréguas à população de Mocuba. A situação agrava-se quando chega o Verão, pois a história repete-se: os poços artesianos secam e das exíguas torneiras só jorra o precioso líquido uma vez por semana e, quando isso acontece, os moradores daquela urbe aglomeram-se nos fontanários para obterem apenas um bidão de 20 litros de água, muitas vezes imprópria para o consumo humano. A crise perdura há anos a nível daquele distrito da província da Zambézia, não obstante esteja circunscrito por rios, cujos afluentes, mesmo nas épocas quentes, continuam intactos.
A situação da falta de água potável perdura há anos e é do conhecimento das autoridades locais. Nos últimos dias, em Mocuba, o cenário é este: de madrugada, nas margens do rio Licungo – um dos principais cursos de água da província da Zambézia – e os seus afluentes, sobressai uma multidão de gente. Mulheres, homens e crianças de diferentes idades procuram aquele local para lavar roupa e loiça.
Estima-se que cerca de 70 porcento da população do distrito de Mocuba não têm acesso a água potável e os poucos que possuem torneira não têm sido suficientes para satisfazer as necessidades, principalmente no Verão devido à irregularidade no seu abastecimento. Os poços tradicionais já não se mostram disponíveis para responderem à demanda.
A estação de captação e bombagem de água que, outrora, ficou inundada na sequência das enchentes, está a fornecer água com cor, cheiro e até sabor desagradáveis. Parte dos residentes prefere consumir o líquido proveniente dos poços artesianos.
Nos bairros Marmanelo, CFM e 25 de Setembro, a situação é mais caótica. Nestas zonas residenciais, a existência de torneiras é insignificante e não cobre sequer um quarto da população. Dos escassos poços artesianos instalados por singulares, mais de metade secou.
Naqueles locais, a procura do precioso líquido é maior, o que coloca grandes desafios aos empregados domésticos, sobretudo no meio urbano. Diga-se de passagem que há um registo de pelo menos 10 jovens que abandonaram os seus postos de trabalho devido às longas distâncias que percorriam com bidões na cabeça.
Elsa Elias é estudante da Faculdade de Engenharia Agronómica e Florestal (FEAF) da Universidade Zambeze em Mocuba e reside no bairro Marmanelo. Há dois meses que o poço artesiano da sua moradia secou e a torneira não jorra água.Diariamente, ela acorda às 04h00, na companhia da sua mãe, à procura de água para o consumo.
“Antes de ir à faculdade, tenho que ajudar a minha mãe a obter água para beber durante as refeições. A vida aqui está cada vez mais complicada, uma vez que a torneira não jorra água há meses e o poço secou, daí o sofrimento de percorrer pelo menos quatro quilómetros com um balde de 20 litros na cabeça”, lamentou a rapariga.
A nossa interlocutora disse que, no ano passado, a situação começou a agravar-se no mês de Setembro. Presentemente, a salvação está no bairro Central, onde dezenas de furos de água resistem e as torneiras jorram pelo menos duas vezes por semana.
Todas as manhãs, por volta das 4h00, Bete Castilho, de 20 anos de idade, mãe de dois menores, sai de casa com uma bacia cheia de roupa e loiça, e percorre seis quilómetros até chegar ao rio Licungo. As suas actividades duram pelo menos três horas. Quando são 10h00, ela regressa à sua habitação no povoado do Bive, com roupa e loiça já lavada e água para o consumo.
“Ser mulher em Mocuba não é tarefa fácil. É, na verdade, aceitar e dispor-se a cumprir na íntegra as tarefas domésticas. O mais duro é a longa distância que percorremos para obtermos o precioso líquido”, afirmou Beta.
Diferentemente de outras mulheres, Helena António vai para o rio uma vez por semana para lavar a roupa, e o afluente mais próximo dista três quilómetros da sua residência. Nos dias em que não se desloca àquelas correntes de água, ela passa a maior parte do tempo à procura do precioso líquido para as suas actividades domésticas, nomeadamente lavar loiça, o banho e o consumo.
“Esta é a nossa principal fonte de água, já que o abastecimento está aquém de responder aos nossos anseios”, disse. Embora ela frequente, com alguma regularidade, o rio Licungo, a fonte de água mais próxima da sua habitação fica a dois quilómetros. A sua caminhada dura pelo menos 15 minutos e, diariamente, faz cinco viagens com um bidão de 20 litros.
Situação similar vive Joana Fernando, mãe de três filhos, que deve garantir água para o banho do seu marido logo as primeiras horas do dia. Devido à crise acentuada de água que Mocuba vive, a sua família contratou um empregado doméstico com vista a ajudar na procura do precioso líquido, mas este acabou por se demitir por não dar conta do recado.
@Verdade soube que o lar dos estudantes da Escola Secundária Pré–Universitária de Mocuba que, igualmente, alberga discentes da FAEF está sem água há semanas. A torneira já não jorra o precioso líquido e a cisterna está vazia. É visível a preocupação dos alunos que passam pelos bairros à procura de água.
“A situação é cíclica, mas este ano os problemas começaram mais cedo. Anteriormente, a procura do precioso líquido arrancava nos meados de Setembro”, disse Mário Zindora, que reside no lar da Escola Pré – Universitária. Ele já percorreu três quilómetros para conseguir água para beber.
Refira-se que a edil de Mocuba, Beatriz Gulamo, numa entrevista concedida ao @Verdade no mês de Abril, revelou que havia um plano em manga no qual o Governo, em parceria com a Administração de Infra-estruturas de Água e Saneamento (AIAS), teria lançado um concurso para que a estação de captação e tratamento de água em Mocuba fosse gerida por um privado, como forma de se expandir e melhorar a qualidade.
Em contrapartida, o Presidente da República, Filipe Nyusi, aquando da visita a Portugal, disse a Imprensa que a estação de captação de Mocuba será expandida e o abastecimento poderá cobrir mais da metade da população, mas o Governo ainda está a procura de financiamento.