Na mês passado (6 Setembro de 2012), realizou-se no centro de conferências Joaquim Chissano, a reunião de apresentação do plano Director de Gás Natural para Moçambique. O documento foi elaborado pelo ICF International Banco Mundial e a reunião foi organizada pelo Ministério dos Recursos Minerais em representação do Governo Moçambicano.
O documento apresentado e disponibilizado para posterior “discussão e comentários” continha informação insuficiente para uma avaliação e análise eficaz, para além do processo em si ( sua elaboração e participação pública) apresentar lacunas graves no que diz respeito à transparência e à democracia em processos de tomada de decisão.
De entre as várias questões negligenciadas tanto pelos consultores assim como pelo Governo, as principais foram: Participação pública? Regulamentação Legal? Corrupção? impacto negativo no turismo, sócioambientais? impacto negativo dos megaprojectos.
Participação Pública – Ausência de participação efectiva
Por definição um plano director é um documento técnico, que deve ser resultado de mecanismos democráticos, onde cria-se a possibilidade da prática de gestão compartilhada, com a participação directa da população no planeamento do sector em questão.
O cronograma e os métodos de participação empregues na elaboração deste plano é um escárnio para com o povo Moçambicano. A maioria da sociedade civil não foi consultada durante a elaboração do mesmo e nem tão pouco foi convidada para estar presente na reunião. Aos que participaram no encontro, foi-lhes dado apenas 1 semana para ler e comentar o relatório, para além de não ter sido fornecido o relatório completo, mesmo depois de solicitado ( disponibilizaram apenas o sumário executivo).
Num País como Moçambique onde 80% da população são camponeses e pescadores, que tem a agricultura e a pesca de pequena escala como actividades de subsistência e tratando-se de um assunto que toca directamente com a sua sobrevivência, organizações de base como a UNAC (União Nacional de Camponeses) assim como outras associações como a de pescadores, deveriam ser consultados, para além que deveriam ter sido incluídos no grupo durante a elaboração do plano, e convidados para o evento, o que lamentavelmente não aconteceu.
Outro facto preocupante é que os workshops tanto para os Governantes como para os restantes stakeholders aconteceram apenas na capital do País– cidade de Maputo, limitando e tornando então impossível a participação dos restantes moçambicanos que na maioria das vezes são pessoas ( tanto as populações como as entidades governamentais locais) que terão as suas vidas modificadas, pois serão directamente afectados pelos os impactos e mudanças que ocorrerão com a extracção do gás natural.
Factos como estes, demonstram uma falta de transparência assim como a ausência de um sistema democrático, integridade e respeito pelo povo Moçambicano nos processos de tomada de decisão.
Regulamentação Legal / Falta de regulamentação de sistemas legais e outros
O plano director pressupõem erradamente que o País está pronto para o desenvolvimento do sector de gás porque “ desde a última década tem vindo a construir um quadro legal regulamentar para gerir o desenvolvimento de seus recursos naturais dentre os quais o gás” . Essa afirmação é totalmente enganosa, uma vez que o País tem as melhores Leis e regulamentos apenas de forma teórica ( no papel) , a aplicação e implementação da tais instrumentos é algo totalmente deficiente no País. Muitas estratégias, leis, regulamentos são criadas mas muitas delas tem lacunas por não se enquadrarem com a realidade do País.
Corrupção Não inclusão de corrupção no Plano Director É muito chocante notar que a palavra “corrupção” aparece apenas 1 vez no documento de 46 páginas. E quando aparece é uma referência feita à Nigéria e não a Moçambique. No Plano Director de Gás nem sequer menciona-se o estado actual da corrupção em Moçambique, quando temos a dúbia distinção de estar na linha abaixo de 120, na 182ª posição no Índice de Percepção da Corrupção.
Impactos negativos no Turismo / Gás ou Turismo
O turismo é um dos maiores contribuintes para a economia do País e um dos sectores que mais cresce. Com a exploração de gás na bacia do Rovuma, o potencial turístico da região será prejudicado. Os impactos da exploração de gás nas reservas marinhas das Quirimbas serão devastadores. As análises dos benefícios apresentados no plano não levam em consideração o potencial turístico da região que será destruído.
Impactos sociais e ambientais ignorados
O Plano Director afirma que o aumento do emprego é um dos objectivos prioritários do País . No entanto o Governo moçambicano não prioriza a formação e capacitação dos moçambicanos, nem apoia pequenas e médias indústrias, por isso é claro que os estrangeiros e as elites locais serão os únicos a beneficiar-se do sector do gás.
O documento sugere que os impactos ambientais são pequenos e podem ser reduzidos se forem geridos adequadamente. No entanto isto é uma afirmação enganosa. A exploração de gás é uma actividade altamente complexa e prejudicial para o meio ambiente. Moçambique não tem um bom histórico na condução eficaz de Estudos de Impacto Ambiental (EIA). Na maioria dos casos, os EIAs agem apenas como um “carimbo” uma vez que as decisões políticas para os projectos são feitos antes dos EIAs serem realizados.
Impactos dos Megaprojetos – Mega Projectos : Quem se beneficia?
O Plano Director recomenda que Moçambique deve priorizar megaprojectos. No entanto, a história dos megaprojectos no País mostra claramente que não tem sido uma maravilha, são extremamente egoístas, e voltados somente para a exportação,estes empreendimentos oferecem aos Moçambicanos apenas uma pequena percentagem de empregos e na sua maioria pouco qualificados ( postos de emprego básicos) e são indústrias altamente poluidoras.
A contribuição dos megaprojectos para o Estado moçambicano em 2010 e 2011 foi insignificante. Em 2010 os oito megaprojectos contribuíram com apenas 0,004% para as receitas do Estado, o equivalente a 83 milhões de euros, e 0,001 para o Produto Interno Bruto. O Presidente da Autoridade Tributária de Moçambique, disse em uma entrevista que a contribuição de megaprojectos em 2011 para o estado foi ainda menor do que a contribuição do sector informal.