Para as clientes da loja de lingerie La Senza, num dos supermercados mais resplandecentes da capital saudita Riad, as novas equipes de vendedoras formadas apenas por mulheres, esta semana, encerraram anos de constrangimento.
Agora as clientes não precisarão mais de sofrer o embaraço dos assistentes homens a tentarem descobrir qual é a medida das suas roupas por baixo, olhando através das suas vestes volumosas e comprovadamente islâmicas.
Para as mulheres por trás do balcão, o decreto do rei Abdullah, ano passado, de tornar as lojas de lingerie um domínio exclusivamente feminino marca também uma mudança social mais profunda: um passo em direcção ao emprego feminino.
“Eu estou contente e sinto-me independente. Não preciso mais que ninguém me apoie financeiramente, além disso, o próprio trabalho fortalece-me”, disse Amani, uma jovem que usava um véu sobre o rosto que atendia clientes em La Senza.
As mulheres correspondem apenas a sete por cento dos sauditas empregados nas empresas privadas, mas formam quase metade dos sauditas em busca de trabalho, segundo dados do governo de 2009.
Neste conservador reino islâmico, onde a segregação por género é rigidamente reforçada, o emprego remunerado era visto como prerrogativa masculina.
O facto de que mesmo as lojas de lingerie eram compostas de funcionários homens até esta semana era visto por muitas mulheres sauditas como um absurdo.
Ao denunciar todas as forças de emprego feminino como uma porta aberta à interação imoral entre os sexos, os clérigos e os seus executores, a polícia religiosa, terminaram, neste caso, por obrigar as mulheres a revelarem detalhes íntimos dos seus corpos para homens desconhecidos.
“É muito confortável agora. A loja está repleta de mulheres e dá para se movimentar livremente e perguntar sobre qualquer coisa sem se sentir constrangida”, disse Heba, uma cliente da La Senza.
Mudança social
Num país onde as mulheres são proibidas de conduzir e precisam de permissão dum parente homem para trabalhar, viajar e mesmo para submeter-se a certos tipos de cirurgia, o emprego feminino é outro campo de batalha entre tradicionalistas e os que querem a mudança.
Embora a família governante al-Saud mantenha uma relação próxima com os clérigos influentes e conservadores wahhabitas, o governo vem pressionando por reformas que deem mais direitos às mulheres.
“Noventa e nove por cento da sociedade à minha volta aceita a situação”, disse Amani. “A minha família apoia-me muito. Eles dizem-me para fazer o que eu quiser porque é a minha vida”, disse ela, ao mesmo tempo em que recusou-se a dar o sobrenome para evitar constrangimento à família.
O establishment clerical, no entanto, continua determinado. O Grande Mufti, a autoridade religiosa mais importante do reino, disse, num sermão recente, em Riad, que permitir que as mulheres trabalhem nas lojas é um crime que viola as leis islâmicas.