O Lesotho, pequena monarquia constitucional encravada na África do Sul, continua num clima de incerteza depois do golpe militar de sábado que obrigou o Primeiro- Ministro, Thomas Thabane, a refugiar-se no território sul-africano. Thabane regressou nesta quarta-feira a Maseru à luz do acordo alcançado segunda-feira entre os líderes dos partidos de coligação no poder no Lesotho para a reabertura do parlamento.
Entretanto, dado o “vazio” de poder, o Rei Letsie III, do Lesotho, havia nomeado para o cargo de Primeiro-Ministro, Motloheloa Phooko, para dirigir interinamente o país. Ministro da Função Pública no Governo de Thabane, Motloheloa Phooko é membro do partido Congresso para a Democracia, que integra a coligação governamental.
Troca de tiros
Thabane, refugiou-se na África do Sul nas últimas horas do último sábado, depois de os militares terem atacado uma instalação chave da Polícia e terem cercado a residência oficial do Primeiro-Ministro. Os militares desmetem o golpe de Estado, defendendo que as suas movimentações têm a ver com uma operação normal para a confiscação de armamento da esquadra da Polícia que era destinada a “políticos fanáticos”.
Depois de três dias de relactiva calmia, a cidade de Maseru sofreu um apagão na noite desta segunda-feira. Foram ouvidos tiros esporádicos de armas automáticas vindos de locais indeterminados. A tensão actual entre os militares e a Polícia significa falta de segurança nas ruas que vem a agravar-se com o corte da corrente eléctrica.
“Não sabemos o que está a acontecer. Eles estão a lutar por questões pessoais e não nos têm dado informações do que está a acontecer,” desabafou Lineo Mattadi, um estofador de 28 anos. Temendo o escalar da violência, o Governo norte-americano recomendeu aos famíliares dos seus diplomatas que se retirassem do reino, no caso de as fronteiras terrestres e os aeroportos virem a ser encerrados. Este é o primeiro país ocidental a alertar para uma possível evacuação.
Pedido de intervenção da SADC
Na maior base militar de Maseru, o clima é descrito de tenso. Os soldados encontram-se fortemente armados e a tomar precauções face a uma eventual intervenção estrangeira. O Primeiro-Ministro refugiado na África do Sul, teria apelado à SADC para que esta enviasse um contigente militar de manuntenção de paz, medida recusada pela organização regional.
A SADC optou por forçar um acordo entre as partes em conflito nos dois dias de negociações de Pretória. A organização regional irá enviar uma equipa de observadores para minitorar os últimos desenvolvimentos políticos, militares e de defesa. A África do Sul cerca na totalidade o pequeno reino e o país faz o seu máximo para conter a violência.
O pequeno reino possui grandes reservatórios de água que fornecem o precioso líquido às cidades de Joanesburgo e de Pretória. O armamento necessário, em caso de um conflito militar de grande escala, deverá passar primeiro pelo território sul-africano.
Controlo militar
O Primeiro-Ministro, Thomas Thabane, poderá receber voto de confiança em resultado das negociações da SADC. O seu grande desafio, dentro de um curto espaço de tempo, será o esclarecimento em torno da figura que controla o Exército. Quando questionado na segunda-feira acerca de quem dirigia o exército, o Primeiro-Ministro Interino, Motloheloa Phooko, teria dito: “Essa é uma questão difícil de responder.”
Fontes da inteligência defendem que o general Tlali Kamoli, comandante das Forças Armadas do Lesotho, teria dirigido o golpe depois de ter sido instado por Thabane, a abandonar o cargo.
O comandante deveria ter sido substituído no cargo pelo general Maaparankoe Mahao, que se encontra na África do Sul, depois de ter sofrido uma tentativa de assassinato. A sua casa teria sido cravada de balas, ataque que forçou a sua esposa e três filhos menores a esconderem-se, durante os cerca de 30 minutos do ataque.
General relutante
Falando em Pretória, o general em fuga, Maaparankoe Mahao, descreveu Tlali Kamoli, como “um general relutante que nega a sua demissão, por medo de ser preso.” “Existem muitos indícios de actos criminais cometidos pela secção sob seu comando.
Ele tem medo que a justiça seja feita quando ele abandonar o posto,” defendeu Mahao. Mahao, alegou ainda que os soldados se teriam apoderado de documentos policiais que implicam o vice-Primeiro-Ministro, Mothetjoa Metsing, que participou nas negociações de Pretória.
Génese da crise
Em 2012 a SADC teria assegurado um acordo entre as três formações políticas do Lesotho para a formação de uma coligação governamental, depois de o partido da oposição ter vencido as eleições, mas sem maioria absoluta.
A coligação é formada pela Convenção de Todos os Basotho (ABC, sigla em inglês), pelo Congresso Democrático do Lesotho (LCD) e pelo Partido Nacional Basotho (BNP). Esta coligação governamental viria a substituir o Governo, que permaneceu cerca de 14 anos no poder, do Primeiro-Ministro Pakalitha Mosisili.
A crise no Lesotho teria tido início quando o actual Primeiro-Ministro, Thomas Thabane, ordenou a abertura de uma investigação criminal visando o vice-Primeiro Ministro, Mothetjoa Metsing.
A turbulência viria a agudizar-se quando as forças de defesa e segurança tomaram posições divergentes. A Polícia apoia o Primeiro-Ministro, Thomas Thabane, enquanto o vice-Primeiro- Ministro, Mothetjoa Metsing, é suportado pelos militares.