As modalidades ditas prioritárias pelo Governo continuam a dar dissabores aos amantes do desporto em Moçambique; todavia, o atletismo paraolímpico é uma das especialidades em que a “pátria dos heróis” já logrou o feito de ser campeã mundial, apesar da falta de reconhecimento por parte das pessoas que tutelam o desporto no país. Hilario Chavela é um exemplo de que, mesmo com as dificuldades, se pode levar as cores da bandeira nacional ao pódio nas grandes competições internacionais. O atleta do Matchedje é um dos poucos campeões do mundo que a apelidada Pérola do Índico viu nascer.
Em Moçambique, poucos são os atletas que conseguiram terminar uma competição internacional num lugar do pódio. Hilário Xavier Chavela, um dos desamparados que honram a bandeira nacional, sagrou-se campeão do mundo de atletismo para atletas paraolímpicos na prova dos 800 metros na classe T12.
O corredor nasceu há 21 anos na cidade de Maputo e, logo cedo, manifestou paixão pelo desporto, em particular o futsal; todavia, praticou aquela modalidade por pouco tempo porque Narciso Faquir viria a descobrir que ele tinha talento para singrar no atletismo.
Chavela declarou que teve uma bela infância em que se resumia em brincar e ajudar a mãe nos deveres de casa. “Tive uma infância risonha. Naquela época se eu não estivesse em casa a auxiliar a minha progenitora nos afazeres do domicílio, estava a brincar com os meus amigos. Nesta fase, o futebol era a minha modalidade predilecta”.
Depois de passear a classe no futsal, em 2010, Hilário Chavela foi convidado por Narciso Faquir, por sinal seu actual treinador no Matchedje e na selecção nacional, a fazer parte do grupo que se ia iniciar no atletismo adaptado. O atleta não negou ao chamado e aceitou o convite que lhe foi endereçado por Faquir.
O corredor, que primeiro se aventurou no atletismo antes de praticar futsal, teve pequenas dificuldades em adaptar-se à nova modalidade, mas Narciso Faquir, conhecido nos meandros desportivos por “Coach” Faquir, esteve sempre presente e disponível para dar algumas explicações sobre as suas opções.
“Nos primeiros dias tive algumas dificuldades, mas sempre tive a esperança de ultrapassá-las. Quando ingressei as condições eram precárias, não tínhamos equipamento e muito menos fundos para custear as despesas inerentes ao transporte para o local onde decorriam os treinos. No presente, apesar das contrariedades, as condições melhoraram sobremaneira”.
Um campeão do mundo que ainda não se sente realizado
Nos Campeonatos Mundiais de Atletismo Paraolímpico que foram disputados na cidade coreana de Seul, Moçambique conseguiu voltar ao pódio de uma competição internacional depois da retirada de Maria de Lurdes Mutola, carinhosamente tratada por “menina de ouro”.
Hilário Chavela terminou a prova dos 800 metros na primeira posição da classe T12 e inscreveu o seu nome no livro em que constam apenas os campeões mundiais desta especialidade. O atleta declarou que conseguiu realizar um dos seus sonhos, visto que desde criança ansiava este grande momento da sua carreira.
“Foi uma experiência única. Ser campeão mundial era um dos meus sonhos. Trabalhei durante muito tempo e com a esperança, acima de tudo perseverança, acreditava que um dia essa ilusão se tornaria realidade. Neste certame, competi com adversários mais velhos em relação a mim e com melhores condições que as nossas, mas não tive medo e confiei nas minhas capacidades. Saímos daqui com um espírito vencedor e, felizmente, conseguimos alcançar os objectivos que havíamos preconizado para aquela competição”.
Ser campeão mundial não é tarefa para qualquer um. Chavela considera a conquista da medalha de ouro o melhor momento da sua curta carreira. “Não foi nos Jogos Africanos muito menos nos Jogos da Lusofonia, mas sim num Campeonato do Mundo; por isso, esta medalha é, até ao momento, o ponto mais alto da minha curta carreira”.
Hilário ainda não é um atleta feliz
Apesar de ter inscrito o seu nome no livro dos campeões mundiais no que diz respeito à prova dos 800 metros da classe T12, Hilário Chavela não se sente um atleta feliz. “Ainda não atingi o apogeu da minha carreira, mas sim metade do percurso dos meus sonhos, visto que o meu maior sonho é ganhar uma medalha de ouro nos Jogos Olímpicos e, depois disso, posso afirmar que sou um atleta realizado”.
“Nós queremos mais…”
O atletismo paraolímpico é, de longe, a modalidade que quando participa numa competição internacional consegue representar de forma condigna as cores da bandeira nacional; porém, ainda continua enteada dos dirigentes desportivos em Moçambique. Segundo o campeão mundial dos 800 metros da classe T12, o Governo apoia, mas os atletas querem mais auxílio para continuarem a representar honradamente o país que os viu nascer.
“O Governo apoia à sua maneira. Não é pouco o que eles nos dão, mas nós queremos mais para continuarmos a trabalhar de modo a trazermos mais medalhas para o país. Não estamos felizes, esperamos que algumas empresas nos patrocinem”.
Fora das pistas
A vida do Hilário, no presente, resume-se ao desporto, uma vez que quando não está a treinar encontra-se a orientar treinos no Núcleo do Bagamoio. No presente ano, por falta de condições, não conseguiu matricular-se numa escola, mas está confiante de que no próximo voltará à escola. Na família conta com o apoio incondicional da sua progenitora e o seu prato favorito é uma feijoada.
Hilário Chavela na terceira pessoa
Simpático é o termo usado pelos colegas para designar o campeão mundial dos 800 metros da classe T12. Denise das Dores, atleta da selecção nacional no que toca ao atletismo adaptado, em conversa com @Verdade, disse que Hilário é um amigo e, acima de tudo, conselheiro.
“O Hilário é uma pessoa conversadora e que gosta de estar com o grupo. Ele é uma pessoa simpática, mas tem um grande defeito que é ficar sozinho quando se encontra em aflição”.
Por seu turno, Edmilsa Governo declarou que Chavela é um colega esforçado que luta para alcançar os seus objectivos e, por via disso, é admirado por outros atletas.
“Conheço o Hilario há dois anos. Ele é um atleta destemido que luta dia e noite para alcançar os seus objectivos. É paciente e muito simpático; por isso, é estimado pelos seus colegas; porém, às vezes não vem treinar alegando que está com fome e, quando o grupo decide reivindicar, ele não abraça a causa”.
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Ainda não se sente realizado
Sério?