O Presidente Filipe Nyusi, ou outra figura de importante do seu Governo, foram ausências notadas durante as exéquias fúnebres de Mário Soares, antigo primeiro-ministro e ex-Presidente de Portugal. “Ficou mal”, afirma o historiador Egídio Vaz que, sem ter a pretensão de encontrar uma justificação para o Executivo, acrescenta que “não é de todo líquido o papel Mário Soares teve na história da descolonização, não há consenso sobre a sua preponderância. Vai perceber que Melo Antunes foi quem assinou o acordo de cessar fogo depois de ter sido substituído por Mário Soares durante todo o processo dos Acordos de Lusaka”.
Para aquele que foi o primeiro funeral de Estado depois do fim da ditadura no País que colonizou Moçambique deslocaram-se a cidade de Lisboa, no início desta semana, líderes e dignitários de diversos Países como o rei Felipe VI de Espanha, os Presidentes do Brasil, Cabo Verde e Guiné-Bissau, o presidente do Parlamento Europeu, o presidente da Assembleia Nacional angolana ou o vice-ministro das Relações Exteriores de Cuba. O nosso País esteve representado pela embaixadora em Portugal, Fernanda Eugénia Moisés Lichale.
O @Verdade perguntou ao historiador moçambicano Egídio Vaz se, por algum motivo de agenda, o Presidente Nyusi estivesse impossibilitado de deslocar-se a capital portuguesa não poderiam representa-lo a presidente da Assembleia da República, Verónica Macamo, o primeiro-ministro ou algum outro ministro do seu Executivo. “Não percebo muito bem, também fico perplexo de como é que não foi possível indicar, na indisponibilidade do Presidente, uma delegação de Moçambique que se iria juntar a embaixadora para acompanhar estas exéquias”, afirmou.
Egídio Vaz disse ainda que a assinatura do livro de condolências, realizada nesta quarta-feira(11) pelo Chefe de Estado na embaixada lusa em Maputo, não é suficiente e acredita que tenha acontecido “alguma desorganização aqui, seguramente o Governo moçambicano encontrará formas de como se penitenciar junto das autoridades(portuguesas). Não por ser sua obrigação mas do ponto de vista das expectativas do momento de cooperação bilateral que se pretende entre Moçambique e Portugal”.
Vaz referiu que recentemente, pela morte de Fidel Castro, também o Presidente Nyusi não participou das cerimónias em Cuba, foi assinar o livro de condolências à embaixada, “mas depois enviou-se uma grande equipa liderada pelo antigo Presidente(Armando Guebuza)”.
“Nem (Joaquim) Chissano, como amigo pessoal, esteve lá. Ainda temos de investigar um pouco para perceber de facto o que é que aconteceu e quais os sinais que estão a ser enviados todavia, em termos da escala de importância, o Almeida Santos era muito mais querido pelo partido Frelimo. Historicamente o papel de Mário Soares nos Acordos de Lusaka foi também controverso”, declarou o Egídio Vaz lembrando que se não fosse por solidariedade com o finado que seria por Marcelo Rebelo de Sousa, que fez para Moçambique a sua primeira viagem como Presidente de Portugal, “temos de reconhecer que claramente isso foi um erro”.
O grande amigo da FRELIMO era Almeida Santos e não Mário Soares
Por outro lado o historiador moçambicano recordou que “Não é de todo líquido que papel Mário Soares teve na história da descolonização, não há consenso sobre a sua preponderância. Vai perceber que Melo Antunes foi quem assinou o acordo de cessar fogo depois de ter sido substituído por Mário Soares durante todo o processo dos Acordos de Lusaka. Porque é que em termos de liderança da delegação Mário Soares foi substituído por Melo Antunes?”.
“Em segundo lugar vai perceber que entre Mário Soares e outro socialista, que é o Almeida Santos, o grande amigo da FRELIMO era de facto o Almeida Santos e não necessariamente Mário Soares. Neste momento talvez tenha sido mesmo por razões de desorganização interna e não de agenda. Eu sei que o Presidente da República estava de férias, até ao enterro de Mário Soares, e quase todo o Governo. Provavelmente por razões de organização não se tenha ido a tempo de se organizar uma expedição para lá”, constatou Vaz.
Contudo, segundo o entrevistado, “Mário Soares não foi um bom primeiro-ministro(português) para Moçambique. Se for a ver em toda governação(em Portugal) o partido que mais agenda tem para África é o PSD(partido social democrata), e a FRELIMO era muito mais ligada ao partido Comunista e a outros partidos de Esquerda do que ao PS(partido socialista). Do ponto de vista da agenda económica o PSD está muito mais implantado em Moçambique do que o PS”.
“Veja a diplomacia económica de António Costa, que é o primeiro-ministro, e veja qual é a prioridade diplomática do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, vai perceber que a agenda para África é muito mais considerada e ponderada pelos partidos da Direita do que necessariamente pelos partidos de esquerda”, referiu o historiador.
Egídio Vaz acrescentou que “Durante a campanha de Nyusi existiu uma firma de consultores de comunicação e estratégia de campanha que veio da América Latina mediada por um dos delfins do antigo primeiro-ministro de Portugal, Pedro Passos Coelho”.
“Eu julgo que existem algumas razões muito mais profundas aqui do que meramente esta panaceia. De uma de outra maneira a nível da diplomacia e da imagem pública ficou mal, eu julgo que em algum momento Moçambique precisa de rever essa posição, ou aproximar-se de uma outra forma para apresentar as condolências”, concluiu Vaz.
Nascido em Lisboa, a 7 de Dezembro de 1924, Mário Alberto Nobre Lopes Soares, advogado e professor, combateu a ditadura no País Europeu e foi fundador e primeiro líder do partido Socialista português.
Após a revolução de 25 de Abril de 1974, regressou do exílio em França e foi ministro dos Negócios Estrangeiros e primeiro-ministro entre 1976 e 1978 e entre 1983 e 1985, tendo pedido a adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia (CEE), em 1977, e assinado o respetivo tratado, em 1985. Foi Presidente entre 1986 e 1996.
Morreu no passado sábado(07), aos 92 anos, havia sido hospitalizado a 13 de Dezembro e tinha estado em coma na maior parte do tempo desde então.