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Estudo acerca de Educação Cívica Eleitoral em Moçambique

Durante as eleições nacionais de Outubro de 2009 em Moçambique, realizámos um estudo sobre a efectividade de diferentes formas de educação cívica eleitoral. Em parceria com instituições locais, Jornal A Verdade e um consórcio de ONG´s , Observatório Eleitoral, implementámos três tipos de intervenção em 161 localidades de quatro províncias de Moçambique (Maputo Província, Gaza, Zambézia e Cabo Delgado).

A primeira intervenção consistiu em educação cívica eleitoral através de telemóveis (SMS); as mensagens incluíram informação sobre os procedimentos eleitorais, candidatos, partidos políticos, tendo sido recebidas durante as duas semanas imediatemente anteriores ao dia das eleições.

A segunda consistiu numa hotline de problemas eletorais; os cidadãos puderam reporter através de SMS ocorrências na campanha eleitoral e no dia das eleições que consideraram problemáticas; esta informação foi disseminada amaplamente depois de verificada, principalmente nas localidades em que a hotline esteve presente.

A terceira consistiu na distribuição do Jornal A Verdade durante o período eleitoral, por aproximadamente seis semanas; A Verdade deu maior expressão a uma mensagem de educação cívica eleitoral durente este período, tendo incluído panfletos da Comissão Nacional de Eleições (CNE/STAE) e a disseminação de uma mecanismo nacional de reporte de problemas eleitorais.

 

Tecnicamente o nosso estudo tomou a forma de uma ‘experiência de campo’. Isto porque as localidades em que cada intervenção foi implementada foram escolhidas de forma aleatória. Este procedimento permite a comparabilidade de cada grupo de localidades (educação cívica eleitoral através de telemóveis, hotline, Jornal A Verdade) com um grupo de controlo. Por consequência e de forma determinante, é-nos então permitido estabelecer que quaisquer diferenças para o grupo de controlo foram causadas pela intervenção correspondente e não por quaisquer outros factores que pudessem ser confundidos com as intervenções.

Em termos de medida dos efeitos das intervenções, conduzimos inquéritos às famílias de baseline (pré-eleitoral, pré-intervenção) e pós-eleitoral. Estes inquéritos alcançaram um total de 1766 respondentes em todas as 161 localidades experimentais. Os cidadãos foram entrevistados acerca da sua participação eleitoral e das suas opiniões e percepções da política moçambicana.

Um amplo conjunto de variáveis demográficas foi também recolhido. De forma significativa, os dados de participação eleitoral (abstenção) foram cruzados com a marcação com tinta dos dedos indicadores (um requisito legal do procedimento eleitoral) e um número de perguntas de conhecimento sobre a experiêncoa do dia das eleições. No final do inquérito pós-eleitoral, também implementámos uma medida de tipo comportamental (carta aberta), através da qual foi solicitado aos respondentes que enviassem SMS contendo as suas proposats de medidas públicas para consideração do novo presidente eleito (foi prometido que o Jornal A Verdade faria chegar ao presidente tais propostas).

Nós interpretamos o envio de um SMS como uma forma de participação política em relação próxima com a ideia de responsabilidade por prestação de contas democrática. Esta nota incide sobre os efeitos encontrados num dos mecanismos – a distribuição do Jornal A Verdade.

Em primeiro lugar e como resultado da maior importância, descobrimos que a distribuição do Jornal A Verdade aumentou a participação nas eleições de Outubro de 2009. Este efeito, atingindo quase 5 porcento, é consistente entre um conjunto alargado de medidas alternativas de participação eleitoral (abstenção; incluindo uma baseada na observação de restos de tinta nos dedos), o que nos assegura que quaisquer enviesamentos de auto-reporte de participação existentes não são determinantes.

Não encontrámos efeitos claros sobre padrões de voto específicos para os diferentes candidatos/partidos políticos, embora tenhamos constatado para algumas especificações econométricas um efeito negativo da distribuição do jornal no score da RENAMO (partido da oposição).

Em termos dos efeitos encontrados no envio das cartas abertas, o Jornal A Verdade é o único meio que atinge um efeito positivo (estatisticamente) significante (uma probabilidade 10 porcento maior de envio de um SMS). Em face destes resultados, podemos concluir que o Jornal A Verdade teve um impacto claro na participação eleitoral, em linha com um aumento do sentido de exigência democrática.

Também encontrámos alguns efeitos interessantes nas percepções sobre problemas eleitorais dos respondentes (como mostrado no artigo científico, não encontrámos evidências de que a prevalência de problemas eleitorais reais tenha sido diferente entre localidades de tratamento e controlo). Embora a hotline pareça ter incrementado a percepção de que estavam a ocorrer situações anormais (nomeadamente violência e fraude eleitorais), a educação cívica eleitoral através de SMS, talvez por causa do seu tom neutral/positivo, diminuiu a prevalência constatada dos problemas eleitorais.

A distribuição do Jornal A Verdade aparece entre os dois outros tratamentos, pois levou à diminuição da percepção de que a violência estava a emergir durante o período eleitoral, embora tendo levado também ao aumento da percepção de que o dinheiro era importante para a política. O Jornal A Verdade aumentou também alguma margem de informação sobre as eleições. Nomeadamente, teve claros efeitos positivos no conhecimento dos cidadãos sobre as candidaturas presidenciais e termos relacionados com as eleições (como, por exemplo, o termo ‘abstenção’).

Observámos que o jornal aumentou o uso dos telemóveis (possivelmente devido à hotline nacional sobre problemas eleitorais que ele disseminou nas suas páginas) e a confiança dos cidadãos na CNE/STAE. Através da medida das mesmas variáveis num grupo que não foi directamente atingido pelos tratamentos, embora vivendo nas mesmas localidades que os respondentes directamente abordados, podemos avaliar os efeitos secundários-indirectos (de spill-over) das intervenções (i.e. para aqueles cidadãos que compõem as redes sociais dos repondentes tratados).

Estes efeitos indirectos foram significativos para o Jornal A Verdade, já que os respondentes que não receberam o jornal denotam efeitos similares àqueles observados nos respondentes que receberam directamente o jornal. Curiosamente, para algumas versões da variável de participação eleitoral, os efeitos nos respondentes não tratados directamente são maiores do que naqueles que receberam o jornal.

Por fim, também verificámos o perfil demográfico que canalizou os efeitos dos tratamentos mencionados acima. Observámos que as mulheres têm desproporcionadamente maior probabilidade que os homens de votar nas áreas da distribuição do jornal A Verdade. Este resultados têm grande significado dado o facto de os homens constituírem a vasta maioria daqueles que votam nas eleições moçambicanas. Também pudemos observar que os respondentes com mais elevado grau educacional votaram menos frequentemente na RENAMO nas áreas de distribuição do jornal.

 

Pedro C. Vicente/ Trinity College Dublin

Paul Collie/ University of Oxford

Jenny C. Aker/ Tufts University

Agosto de 2010

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