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Editorial: Comer e calar

A história passou-se, faz hoje oito dias, (sexta-feira, dia 22) com o nosso jornalista estagiário Abanês Ndanda. Em Hulene, enquanto esperava que o chapa o levasse ao bairro CMC, o repórter presenciou a entrada de três indivíduos numa barraca. Um encontrava-se à civil, os outros dois eram agentes da PRM trajados com farda de serviço. Volvido um minuto ouve-se o som de chapadas e socos. Um jovem, estudante da Escola Secundária Força do Povo, estava a ser espancado pelos dois agentes da ordem.

Os socos e os pontapés eram brutais. Movido pelo espírito jornalístico e de denúncia do que não está correcto, Abanês, munido do seu telemóvel, resolveu registar a cena, fotografando-a.

O que foi o nosso homem fazer! Um dos agentes topou-o e imediatamente confiscou-lhe o aparelho para em seguida algemá-lo. E foi assim que, debaixo de socos e pontapés, o nosso repórter e o jovem estudante, percorreram, algemados, os três quilómetros que separam a paragem do chapa, onde se encontravam, e a esquadra.

Antes de ser algemado, Abanês teve o cuidado de colocar a salvo os 3700 rands, depositando-os na mala que trazia consigo. “A brutalidade foi tanta que as algemas já tinham estancado o sangue entre o pulso e o resto do braço”, disse Abanês.

Já perto da esquadra, um terceiro indivíduo, que dizia ser polícia, procurou convencê-lo a aceitar uma saída airosa: Abanês devia entregar o telemóvel e “falar como homem”.

Depois, uma vez chegados à esquadra, deveria ainda declarar que perdera o telemóvel. Se assim o fizesse, a libertação estaria garantida para o dia seguinte. Como Abanês não anuiu, o aparelho foilhe retirado à força. Uma vez na esquadra, apercebeu-se de que o homem não fardado havia levado o seu telemóvel.

Após muita berraria lá apareceu o aparelho. Depois iniciou-se o depoimento, com sucessivas declarações contraditórias dos agentes. No final, as autoridades resolveram apreender-lhe o telemóvel e libertá-lo, permanecendo o estudante detido.

Porém, no dia seguinte de manhã, Abanês deveria comparecer naquele posto policial. Ao chegar a casa nova surpresa: o livro onde tinha guardado os rands havia desaparecido e com ele toda a quantia.

No dia seguinte, ao apresentar-se na esquadra às 7.30 minutos, conforme estava combinado, perguntaram-lhe, inesperadamente, se tinha algum dado novo. Abanês respondeu-lhe afirmativamente, queixando-se do roubo dos rands.

Todavia, a ordem de prisão veio logo a seguir. Cerca das 15 horas são convocados para outro interrogatório, onde os agentes lhes explicam que só darão ordem de soltura contra a promessa de Abanês se ‘esquecer’ do roubo dos rands.

E assim terminou uma saga de mais de 24 horas de abuso de autoridade. Os direitos humanos mais elementares foram, mais uma vez, espezinhados pela bota cardada dos agentes da PRM.

Casos como este sucedem-se às centenas por este país fora. Este só foi tornado público porque havia um jornalista envolvido. Imaginem quando se trata de cidadãos anónimos! Nestes casos só há uma receita: comer e calar.

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