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Cultivo de mandioca para produção de cerveja não está a melhorar a vida dos camponeses em Moçambique

Cultivo de mandioca para produção de cerveja não está a melhorar a vida dos camponeses em Moçambique

Foto de Momade IbraimoO cultivo de mandioca e a sua comercializam para a fabricação de cerveja no nosso país está a defraudar a expectativa dos camponeses moçambicanos. “Em 2017 todos os produtores obtiveram rendimentos médios mensais abaixo da linha de pobreza e o índice de pobreza multidimensional praticamente não se alterou” constatou o académico Momade Ibraimo num estudo que realizou na província de Inhambane.

Durante as comemorações dos 20 anos das Cervejas de Moçambique (CDM), em 2015, o Presidente Filipe Nyusi destacou a “experiência inovadora de produção da cerveja, com base na mandioca, que iniciou no distrito de Ribáue na Província de Nampula e expandiu-se a Inharrime na Província de Inhambane, com o envolvimento de cerca de 6.000 produtores, permitiu que este produto agrícola nacional pudesse ter um mercado assegurado”.

“É facto que a produção de cerveja está a gerar mais empreendedores e a contribuir para a substituição gradual de matérias-primas importadas. Essa é uma contribuição inequívoca para o desenvolvimento nacional”, acrescentou no seu discurso na ocasião o Chefe de Estado moçambicano.

Dois anos após o júbilo do Presidente Nyusi e quatro após o início da aquisição da mandioca produzida pelos camponeses da província de Inhambane pela Empresa Holandesa de Desenvolvimento e Comércio Agrícola (acrónimo em língua inglesa DADTCO), que intermedeia o negócio que tem como comprador final as CDM, o jovem académico Momade Ibraimo, Licenciado em Economia e Monitor de Investigação do Observatório do Meio Rural (OMR) analisou os primeiros impactos da eventual transformação sócio económica destes agricultores na província de Inhambane, onde existem 4.212 produtores do universo de 8.533 envolvidos nesta “experiência inovadora”.

“O primeiro conflito entre a empresa e os produtores é que a mandioca tem 48 horas para ser processada depois de ser colhida, depois desse tempo ela começa a murchar e perde algum peso. Tem acontecido, de forma frequente nos últimos tempos, um atraso na recolha nos campos o que faz com que a mandioca perca algum preso e o rendimento seja menor” começou por indicar Momade Ibraimo durante a apresentação do seu estudo num workshop que aconteceu em Maio na cidade de Maputo.

Camponeses “pedem de forma urgente que o preço seja melhorado”

Foto de Momade IbraimoDe acordo com investigador do OMR outro conflito emerge “porque nem sempre a empresa tem disponível os valores monetários suficientes para fazer os pagamentos de um determinado dia e quando é assim os produtores levam uma senha e ficam à espera da ligação, que pode demorar 1 a 2 semanas, para receber o seu valor”.

“O processo de pesagem também provoca alguns conflitos, alguns produtores não são clarificados como funciona a balança electrónica e acham-se injustiçados, os produtores após a colheita estimam o rendimento que vão ter mas depois da pesagem recebem valore se more inferiores aos esperados”, apurou Momade Ibraimo que constatou que “o preço é o principal factor de insatisfação dos produtores, cerca de 98 por cento estão muitos insatisfeitos ou insatisfeitos com o preço, pedem de forma urgente que o preço seja melhorado”.

Além disso o jovem académico referiu que “os produtores também queixam-se de falta de apoios em vários sentidos, quer ao nível de insumos quer no acompanhamento da sua produção, ou seja estão numa situação de arcar com todos os riscos da produção até a parte da comercialização”.

Variedades melhoradas de mandioca, ideais para o fabrico de cerveja, são impróprias para o consumo a fresco

No estudo Momade Ibraimo averiguou ainda que “depois da chegada da DADTCO muitos produtores passaram a cultivar a mandioca como monocultura esperando a partir daí obter maiores rendimentos e poderem diversificar a sua dieta alimentar, contudo não tem resultado”.

Foto de Momade IbraimoOs dados recolhidos pelo investigador do OMR mostram que a maioria dos camponeses que venderam mandioca à DADTCO por 2 meticais cada quilograma obtiveram rendimentos médios mensais em torno dos 1.070 meticais, o que representa menos de um terçoda linha de pobreza segundo o Banco Mundial que a estabelece em 1,90 dólar por dia.

“Na realidade, estes rendimentos não se traduzem na melhoria significativa da vida dos produtores. Por exemplo, verificámos que, do total das famílias que venderam mandioca à empresa, 71,7% (33 das 46 famílias) utiliza material local (capim, colmo ou palmeira) para cobertura das casas. Admitindo um cenário em que os pequenos agricultores produzam variedades melhoradas de mandioca, o que possibilitaria quadruplicar os rendimentos monetários, o rendimento médio mensal seria de cerca de 4.280 Meticais, um valor ligeiramente acima do nível da pobreza. Contudo, considerando que este panorama só seria possível com recurso a variedades não preferidas pelos camponeses”, apurou o académico.

Momade Ibraimo notou ainda que certas variedades melhoradas de mandioca, ideais para o fabrico de cerveja, são impróprias para o consumo a fresco, algo que faz parte dos hábitos alimentares dos moçambicanos.

“O rendimento anual tem descido ao longo não dos anos porque cada vez menos produtores têm comercializado a sua produção, geralmente comercializam para obter rendimento para questões pontuais. Em conversa com muitos produtores em Zavala disseram que venderam nesse ano porque precisavam de terminar a cobertura da sua casa, se não fosse isso não vendia à DATCO, preferiam esperar pelos revendedores que pagam um pouco mais”, revelou o investigador moçambicano.

Iniciativa de cerveja à base de mandioca beneficia significativos incentivos fiscais em Moçambique

O @Verdade confrontou a Empresa Holandesa de Desenvolvimento e Comércio Agrícola com este estudo e obteve os seguintes comentários: “Moçambique é o único país em África que tem uma operação de processamento de mandioca em escala industrial. A DADTCO esta olhando para a expansão do seu mercado a partir de Setembro, onde começaremos a fabricar farinha para substituir a farinha de trigo importada na industria panificadora e sendo este mesmo trigo produzido por agricultores dos EUA em detrimento da nossa economia local”.

“Os nossos produtores estão ano após ano interessados em vender a mandioca para DADTCO e vemos um aumento nos volumes produzidos por hectare, que resulta no aumento da renda familiar, o que é uma notícia fantástica. No passado o rendimento por hectare de mandioca rondava aos 1.8 toneladas, mais com a vinda da DADTCO o mesmo rendimento subiu para 4.7 toneladas por hectare”, acrescentou a empresa por correio electrónico.

A empresa “reconhece que ainda existe um trabalho forte a se fazer visto que, as novas variedades disseminadas pelo IIAM tem um potencial de 20 toneladas por hectare, mais o mesmo só pode ser alcançado, existindo uma forte participação de todos intervenientes desta cadeia de valores onde a DADTCO e’ somente o elo de ligação entre o mercado e os camponeses. Assim sendo, a DADTCO e seus parceiros irão continuar com seus programas de intensificação na produção desta cultura de modo que, com o aumento dos volumes possa-se aumentar a renda familiar deste grupo alvo. A DADTCO encontra-se comprometida em continuar com este processo e trabalhar com pequenos e médios camponeses no desenvolvimento desta cadeia de valores”.

“Realçar que a cadeia de valores da mandioca é um bom exemplo, olhando para o sucesso do produto final que e’ a cerveja Impala de mandioca, sendo que a mesma abriu caminho para novas cadeias de valores como o caso do milho que esta sendo usado para o fabrico da nova cerveja Impala na base de milho”, clarificou a DADTCO.

Importa no entanto referir que a iniciativa das Cervejas de Moçambique de produzir cerveja à base de mandioca, e também de milho, não tens fins sociais nem altruístas mas antes aproveitar os significativos incentivos fiscais que o Governo de Filipe Nyusi decidiu conceder para as bebidas do género incorporem pelo menos 50 por cento destes dois alimentos nacionais.

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