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Chico Carneiro, o cineasta que escala montanhas

Chico Carneiro

A magia do cinema entrou na vida de Chico, nome pelo qual todos o conhecem, vendo filmes no cinema onde o seu pai, Sr. Duca Carneiro, exibia fi lmes no Castanhal (Pará, Brasil), sua terra natal, já lá vão quase seis décadas. Em 1983 aceitou o desafio de um conhecido e veio trabalhar em Moçambique, país pelo qual se apaixonou e nunca mais deixou.

Autodidacta desde a adolescência, lendo tudo o que podia sobre cinema e vendo muitos fi lmes que fi zeram a história do cinema, Chico Carneiro teve a felicidade de ganhar de presente do pai uma câmara de fi lmar, com a qual começa a fazer os seus primeiros fi lmes amadores em super 8mm e 16mm, na altura curtos, afi nal as películas na altura não permitiam muito mais.

A sua vida profissional no cinema começa como assistente do fotógrafo, num fi lme feito na sua província. Depois migrou para a grande cidade, São Paulo, onde adquiriu maior experiência e se estabeleceu como assistente de câmara, sonhando com o dia em que poderia fazer fi lmes sobre a sua terra, o Pará na Amazónia.

À Pérola do Índico chegou para trabalhar na Kanemo, um empresa que nos tempos áureos do cinema em Moçambique foi pioneira na produção privada de alguns fi lmes moçambicanos, como o documentário “Fronteiras de Sangue” ou o “Karingana wa Karingana”, este último sobre o poeta José Craveirinha. Uma década depois, na companhia de amigos que então fi zera em Maputo, cria a Promarte.

A maioria dos homens quando chega à faixa dos 50 anos sofre da crise de meia-idade, altura em que ocorre a sensação de que o mais importante da vida já passou porém, para Chico, um praticante de vólei sempre assíduo nas areias da praia Miramar, foi o momento de começar os filmes da sua autoria como sempre desejou fazer.

Em 2001 viaja ao Brasil e, na Amazónia paraense, filma a história de três homens pobres da região que vão cumprir a promessa de subir o rio Amazonas.

“Os Promesseiros” é o título do documentário que tem como pano de fundo as festividades do Círio de Nazaré. Durante as filmagens decide fazer uma série sobre os barcos da Amazónia, daí sempre que volta de férias para a sua terra natal filma mais uma obra cinematográfi ca.

“Casa do Gilson, Nossa Casa” é a obra que se segue, um documentário que mostra o chorinho paraense através do perfi l de vários “chorões” que frequentam a antológica “casa do Gilson”, casa de música em Belém do Pará.

Como ele tem liberdade total sobre a forma de fazer os filmes da sua autoria, decidiu rodá-los sem pesquisas ou roteiro, tentando, deste modo, mostrar a realidade vivida pelos personagens.

Em 2006 documenta a saga de um herói brasileiro, Seu Didico, um paraense que vive nos rios da Amazónia paraense e ganha a vida no velho barco Samaria. Tal como nos restantes filmes “Seu Didico: Paraense Velho Macho” é feito com a câmara na mão, o som directo e captado com o microfone direccional da câmara.

Ao navegar por outros Brasis com a sua câmara, agora digital, regista a imparável destruição da floresta amazónica e mostra-a num documentário que intitulou “Balsa Boieira”, o registo fiel de uma viagem de ida e volta de uma balsa, desde Belém até Belo Monte, na transamazónica, e regressando para a Vila de Pernambuco, no rio Guamá.

O trabalho mais recente de Chico Carneiro, que estreou na edição 2010 do Dockanema em Maputo, intitula-se “Nos Caminhos do Rei Salomão” e retrata a viagem de 36 horas de um navio que transporta passageiros e carga, entre as cidades de Belém e Anajás. Este documentário leva-nos numa viagem no navio “Rei Salomão”, desde o dia da partida, até ao destino final mostrando o quotidiano da tripulação e dos passageiros.

Nas obras de autor de Chico fica-se a conhecer mais sobre a Amazónia, o drama da imparável destruição da floresta amazónica mas também identifica-se uma ponte entre a vida dos brasileiros do Pará e muitos moçambicanos em situações similares – os que vivem da extracção da madeira, as pessoas afectadas pela malária ou a vida dos homens que trabalham nos barcos.

Chico confidenciou-nos que com os rios de Moçambique, como fio condutor, tem planeado para breve fazer filmes da sua total autoria em Moçambique.

Para além do cinema e da fotografia, Chico Carneiro é também caminhante, um amante da natureza. Com um grupo de amigos, aventurou- se no passado ano de 2008, pela província de Manica, até ao ponto mais alto de Moçambique, o monte Binga.

Quando lhe perguntei porque decidiu escalar o monte respondeu a sorrir que era porque estava lá (parafraseando o primeiro homem que escalou o monte Everest). Porque gosta de desafios, da vida ao ar livre e do ecoturismo já tem planos para escalar outro monte em Moçambique nos tempos mais próximos.

Homem de esquerda, que votou em Lula, e garante que não vai votar em Dilma, Chico vê o futuro do cinema em Moçambique alavancado nas produções de baixo custo, em vídeo, mas considera fundamental aprender o cinema na escola. “Se se introduzir uma cadeira de cinema desde a escola primária estar-se-á a potenciar o nascimento de futuros cineastas moçambicanos” afirma.

Por outro lado, considera necessário que se façam longas-metragens em película e com grandes orçamentos de produção até para dar trabalho aos profissionais que existem no país e estes servirem de escola para os jovens que querem descobrir a magia da sétima arte.

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