É filha da casa. Escreve e declama poemas em várias línguas moçambicanas, sobretudo em cicopi, com um gosto imensurável. Cândida Dambe, ou simplesmente Dambinha, como é carinhosamente tratada, é uma mulher de poucas palavras e, devido à sua timidez, dificilmente encara a realidade.
Para quem a vê pela primeira vez a declamar na sua língua vernácula, cicopi, pode, de imediato, interpretá-la como uma feminista com forte presença no palco. Na verdade, devido às suas habilidades, quando recita, a sonoridade, a dicção, a bravura e a gestualidade transformam-na numa poetisa vibrante e segura.
Mas, nos palcos, como forma de assegurar os créditos dos seus admiradores, Dambinha mostra que possui duas vidas que disputam o mesmo corpo: o espírito social e artístico. No entanto, enquanto a vida artística luta pela liberdade e bravura, a alma social cinge-se apenas ao sigilo e na timidez.
Sobre Cândida há muito por se dizer: “Comecei a gostar das letras desde criança. O meu pai foi uma das pessoas que sempre quis que vivêssemos da literatura. Sou a filha mais nova da casa e desde cede ensinaram-me a fazer leituras em bandas desenhadas, exclusivamente de Pato Donaldo”. “O meu progenitor é que me ensinava a interpretar as figuras. Ele criava e narrava as histórias contidas nos desenhos de um jeito fascinante, interpretando cada papel dos actores. Na verdade, ele encarnava cada personagem”.
Ao contrário do que acontece com um número considerável dos nossos compatriotas, cuja adolescência foi marcada por outras actividades que, de uma ou de outra forma, os afasta(ra)m da inleitura e da escrita criativa, Cândida Dambi cresceu, diga-se de passagem, no berço das letras. E ela explica-se: “Comecei a escrever muito nova. O meu pai foi e ainda continua a ser a minha influência nas letras. Quando frequentei a 6ª classe, por exemplo, fiz vários escritos que oferecia a amigos e colegas, pois não sabia porque e para quê escrevia”.
No entanto, quatros anos depois, na 10ª classe, Dambe conheceu um professor que lhe estimulou a continuar a escrever. Nessa altura, devido ao seu atrevimento e vontade de crescer, a sua vida artística foi-se revelando continuamente, mas “ainda não acreditava muito nas minhas capacidades. Talvez porque ainda era rebelde”.
Escrevendo e declamando, mais tarde, Cândida integra-se num grupo de jovens amantes das letras com o propósito de formar uma união de escritores amadores. Em resultado disso, formou-se o Movimento Literário Kuphaluxa. O agrupamento serve de alicerce para que os amantes das letras consigam alcançar os seus objectivos, como também para partilharem algumas experiências tidas com a escrita e leitura de várias obras literárias.
“Então, foi na formação de redacção criativa que conclui que não sabia escrever. E isso acabou comigo. Comecei a não gostar dos meus textos. Tudo o que redigia escondia”, confessa a poetisa defendendo que a análise surgiu “porque tinha colegas melhores que eu. Mas, para não matar o génio que carregava dentro de mim, comecei a visitar algumas escolas da nossa urbe para mostrar o que eu fazia. Fui conhecendo pessoas que escreviam melhor, com as quais passei a conviver e a partilhar experiências da literatura”.
“O cicopi identifica-me!”
Não é obra do acaso que em quase todos os poemas Cândida Dambe declama em cicopi. A poetisa garante que esta é a única forma de demostrar a autenticidade e a beleza da sua cultura. A preferência pela sua língua vernácula deve-se à influência que tem sofrido diariamente dos machope, pois, para além de ser filha de pessoas oriundas da província de Inhambane, na sua zona, no bairro T3, há vários conterrâneos seus.
“Sempre quis conhecer outras realidades literárias, o que ainda não aconteceu. Eu sou machope, mas, em casa, a língua não é tão falada. Tive a sorte de conversar com os machopes e ouvir as suas histórias. Escutar algumas músicas produzidas com a utilização da timbila. O meu avô, particularmente, contava histórias em cicopi sobre uma época particular na sua terra”.
Por isso, “nos meus textos, recrio os provérbios do povo chope. São histórias que o meu avô contava”. Nos seus versos, Cândida Dambe não dispensa o quotidiano da classe juvenil. Fala das paixões e dos amores frustrados.