Ao contrário do que o presidente do partido Frelimo(e também Presidente de Moçambique), Filipe Jacinto Nyusi, afi rmou sobre “a agenda do país não se resume ao assunto da dívida externa” o Banco Mundial declarou que a só a “resolução do processo de reestruturação da dívida em curso representaria um impulso considerável para as perspectivas fiscais e uma importante mudança no sentido de restabelecer a sustentabilidade macroeconómica”. Aliás, embora Nyusi tenha prometido, mais uma vez, que o seu Governo “vai continuar a colaborar com a Procuradoria Geral da República na implementação das recomendações da Kroll sem pré-julgamentos”, terminou o seu discurso, de encerramento da VI sessão ordinária do Comité Central(CC) do partido no poder, a “ congratular ao Camarada Armando Emílio Guebuza”, o mais do que provável arquitecto-mor dos empréstimos da Proindicus, EMATUM e da MAM.
“Minhas Camaradas e Meus Camaradas! No âmbito da questão da dívida, o relatório que a Procuradoria Geral da República tornou público, aponta haver irregularidades capazes de indiciar o crime. É tempo de deixar a justiça trabalhar dentro do espírito de separação de poderes” declarou o presidente do partido no poder na passada sexta- -feira(28), quiçá reconhecendo a falta de cooperação que os auditores da Kroll enfrentaram durante o seu trabalho por parte de várias Instituições e de Funcionários do Estado que tiveram papel activo no processo das dívidas da Proindicus, EMATUM e MAM.
Filipe Nyusi também reiterou que o seu “Governo vai continuar a colaborar com a Procuradoria Geral da República na implementação das recomendações da Kroll sem pré- -julgamentos para que não se corra o risco de usurpar competências dos que detêm o respectivo poder”.
Um discurso ambíguo pois o presidente do partido Frelimo fala “pré-julgamentos” porém antes mesmo da Auditoria a Comissão Parlamentar de Inquérito à Dívida assim como o Tribunal Administrativo haviam constatado que a emissão das Garantias Bancárias para os empréstimos das três empresas estatais violaram a Constituição da República assim como as leis orçamentais de 2013 e 2014.
É que apesar dessas constatações datarem de 2016 nenhum dos funcionários do Estado que orquestraram e materializaram essas violações e ilegalidades foram sequer constituídos arguidos. Diga-se que pelo menos dois dos mais proeminentes arquitetos desses empréstimos estiveram na reunião do Comité Central.
Aliás Nyusi no seu discurso de encerramento fez questão de louvar um deles, “Queremos antes de terminar a nossa intervenção congratular ao Camarada Armando Emílio Guebuza, antigo Presidente da FRELIMO, que até Março de 2015 dirigiu este Comité Central onde grandes sucessos foram conseguidos incluindo a eleição da direcção que preside o actual ciclo de governação”.
Importa no entanto recordar que a equipa do Fundo Monetário Internacional(FMI) que esteve no nosso país no início do mês deixou claro ao Executivo de Filipe Nyuis que “persistem lacunas de informação essencial que carecem ser resolvidas, no que concerne ao uso dos proveitos dos empréstimos” e só de “garantias de responsabilização” é que começará a ser discutido um novo programa de ajuda à Moçambique.
Portanto a VI sessão ordinária do Comité Central perdeu a oportunidade “histórica” de autorizar a Justiça, sejamos claros não há separação de poderes em Moçambique, a responsabilizar os funcionários do Estado envolvidos nas dívidas inconstitucionais e ilegais dando um passo firme para a retomada do apoio financeiro do FMI e doadores.
“Reestruturação da dívida continua a ser um factor chave para recuperar as margens de segurança a nível fiscal e a estabilidade macroeconómica”
Ainda no Comité Central Filipe Nyusi manteve a retórica de enganar o povo afirmando que “a agenda do país não se resume ao assunto da dívida externa perante as inúmeras adversidades com que os moçambicanos se debatem”. É que o mais recente relatório do Banco Mundial sobre Moçambique deixa claro que “a reestruturação da dívida continua a ser um factor-chave para recuperar as margens de segurança a nível fiscal e a estabilidade macroeconómica”.
“Actualmente, Moçambique não dispõe de capacidade para cumprir todas as suas obrigações como devedor. A sua falha de pagamento das obrigações soberanas foi a primeira que ocorreu nos países africanos desde que a Costa do Marfim não pagou as respectivas obrigações do tesouro, em 2011. Os atrasos nos pagamentos a credores privados continuaram a acumular-se em 2016 e 2017, tendo alcançado cerca de 590 milhões de USD em Julho de 2017” recorda o relatório divulgado nesta segunda- -feira(31) com o título “Actualidade económica de Moçambique – Uma Economia a Duas Velocidades”.
O Banco Mundial acrescenta ainda que “é provável que, a médio prazo, o país continue em dificuldades no que se refere à dívida, a menos que as autoridades consigam chegar a acordo com os credores quanto à reestruturação de uma parte da mesma. As medidas para reforçar a gestão da dívida interna, em todo o sector público e não apenas a nível do governo central, constituem também um ingrediente-chave para restaurar a estabilidade”.
Projecto nacional de aumento da produção e produtividade em todos os sectores de actividade é falácia
Outra falácia do discurso do presidente do partido Frelimo que o Banco Mundial(instituição que ao contrário do FMI não suspendeu o seu apoio directo ao Orçamento de Estado moçambicano) mostra tem a ver “projecto nacional de aumento da produção e produtividade em todos os sectores de actividade”.
O relatório confirma o que os economistas nacionais independentes, apelidados de “Apóstolos da desgraça”, têm constatado a Economia moçambicana continua ancorada a indústria extractiva, tal como aconteceu na década passada, com os resultados que hoje se conhecem no que respeita ao aumento do número de moçambicanos mais pobres.
Paralelamente, “O contributo da indústria transformadora para o crescimento contraiu-se em mais de dois terços, quando comparado ao de 2015, tendo continuado a diminuir no primeiro trimestre de 2017. Esta tendência é confirmada pelo Índice de Produção Industrial (IPI), o qual mostra a queda dos níveis de produção de bens de consumo não duradouros, bens intermédios e equipamentos”.
“Os níveis de emprego na indústria também se têm mostrado vacilantes. De acordo com o Índice de Actividades Económicas elaborado pelo Instituto Nacional de estatística (INE), a maior contracção no emprego ocorreu no sector industrial, principalmente no fabrico de bens alimentares, onde, entre 2015 e 2016, o índice de empregabilidade média desceu quase 7 %”, refere o documento do Banco Mundial que estamos a citar.
Ademais o sector privado tem sido asfixiado pela política monetária do Banco de Moçambique que aumentou a taxa de juro de referência para créditos numa das mais elevadas da África subsariana agravando as taxas médias de crédito da banca comercial, que rondam os 30 %, e “são proibitivas para grande parte do sector privado. É necessário fazer mais para ajudar a recuperar a economia de Moçambique”, apela o Banco Mundial no seu relatório.