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Atestado de residência declarado inconstitucional

O Conselho Constitucional (CC) de Moçambique, órgão de soberania responsável pela administração da justiça em matérias de natureza jurídicoconstitucional, declarou inconstitucional a exigência segundo a qual os candidatos à presidência devem ter residido no país durante pelo menos 12 meses antes da realização das eleições presidenciais. Esta é uma das várias matérias submetidas à apreciação do Conselho, em 2009, pelos deputados da coligação Renamo-União Eleitoral na Assembleia da República (AR), o Parlamento moçambicano.

A Constituição, segundo o Conselho, estabelece exigências para que um cidadão seja candidato presidencial. O candidato deve possuir nacionalidade originária e não outra, ter no mínimo 35 anos de idade e deve estar no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos e ter sido proposto por, pelo menos, 10 mil eleitores. Todo o indivíduo que preencha estas requisitos, e que esteja devidamente recenseado, pode concorrer para Presidente da Republica.

Porém, a lei sobre as eleições presidenciais e legislativas aprovada pela Assembleia da Republica aumentou mais requisitos. Os cidadãos que não residiram habitualmente no país há 12 meses antes da realização das eleições não podem concorrer, excluindo, por conseguinte, qualquer candidato na diáspora ou a trabalhar nas embaixadas do país.

O Conselho Constitucional considera injustificadas as exigências de requisitos não previstos na Constituição, uma vez que ‘os direitos, liberdades e garantias só podem ser limitados nos casos expressamente previstos na Constituição’, tais como estado de sítio ou emergência (nunca declarados em Moçambique). A Constituição declara igualmente as circunstâncias nas quais os cidadãos são impedidos de concorrer nas eleições presidenciais. Os candidatos que exerceram dois mandatos consecutivos, os criminosos condenados e qualquer outro que tiver renunciado a presidência estão impedidos de concorrer por 10 anos. Mas não diz nada sobre o atestado de residência.

Segundo a Constituição, é de exclusiva competência dos legisladores da AR aprovar a legislação eleitoral, mas a mesma não deve ser exercida de forma discriminatória, pelo contrário deve respeitar as outras normas constitucionais, não inventar outras circunstâncias que tornam inelegíveis os potenciais candidatos. “Na regulamentação das eleições, os legisladores não podem restringir os direitos consagrados na Constituição, devendo limitar-se aos parâmetros estabelecidos pela Constituição”, afirma o Conselho. A questão é mais pedagogica.

Desde as primeiras eleições presidenciais multipartidárias, em 1994, nenhum moçambicano a residir fora do país manifestou alguma vez qualquer interesse de concorrer para a presidência. A Renamo não saiu bem sucedida nas outras petições submetidas ao Conselho Constitucional, em que contesta a exigência de depósito de 100 mil Meticais (cerca de três mil dólares) por cada candidato à presidência, afirmando que devia reprovar esta exigência, uma vez que nenhum depósito está previsto na Constituição.

O Conselho vê, porém, esta matéria como instrumental ou adjectiva e nao substantiva ou material e decidiu que a AR está no pleno direito de impor barreiras financeiras “que visam destacar a seriedade em concorrer para um cargo como este, liderar os destinos da Nação”. Mais ainda, o depósito do valor visa travar os candidatos que entram na corrida em busca dos fundos do estado disponibilizados àss campanhas eleitorais, ou os que simplesmente esperam tirar benefícios da crescente visibilidade resultante de uma eleição.

A Renamo quer ver igualmente reduzidos os poderes da Comissão Nacional de Eleições (CNE), e afirma que é ‘uma parte interessada’ nas eleições e não devia decidir sobre as queixas apresentadas pelos candidatos ou partidos políticos. O partido da oposição afirma igualmente que a CNE está a usurpar os poderes dos tribunais.

O Conselho aponta, por outro lado, que a CNE nunca, de facto, teve a última palavra em disputas e recursos eleitorais. Um tribunal eleitoral específico foi criado para lidar com os recursos submetidos após o pleito de 1994 e nos processos subsequentes o órgão de recurso foi primeiro, o Tribunal Supremo, e agora o Conselho Constitucional. Mais ainda, a CNE é igualmente um órgão especificamente mencionado na Constituição, com poder de supervisionar o recenseamento e outros processos afins.

A Constituição estipula igualmente que a CNE deve ser “independente e imparcial” e estes princípios estão plasmados na lei eleitoral, que banem os membros daquele órgão de exercer cargos nos partidos políticos ou de se envolver em actividades de partidos políticos. Além do mais, uma vez nomeados, os membros da CNE não podem ser demitidos durante o exercício do mandato, como forma de garantir maior independência. Todas estas informações suscitaram dúvida em relação as alegações da Renamo segundo as quais se tratava de “uma parte interessada”.

O papel da CNE no tratamento das queixas, segundo a lei eleitoral, circunscreve-se a “interpretação e aplicação das normas que regulam as eleições”. Este exercício, segundo o Conselho, é uma função administrativa e não jurisdicional. Adicionalmente a isso, a lei não descarta a possibilidade de os recursos serem encaminhados aos tribunais, e em particular ao próprio Conselho Constitucional que, apesar do seu nome, trabalha como um tribunal constitucional.

Segundo o Conselho, nada na Constituição sustenta a posição da Renamo segundo a qual os tribunais têm monopólio na decisão sobre conflitos e interesses em primeira instância, embora tenham a última palavra nos casos em que um partido se sinta lesado e submete um recurso.

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