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Arrogância do município deixa famílias ao relento em Nampula

Arrogância do município deixa famílias ao relento em Nampula

Mais de 50 famílias viram as suas casas demolidas pela edilidade, sem aviso prévio, na unidade comunal de Mutita, no posto administrativo municipal de Muatala, província de Nampula, e vivem ao relento, desde o último sábado (20). Alguns indivíduos que não foram acolhidos pelas pessoas mais próximas abrigaram-se debaixo de cajueiros e mangueiras; porém, na noite de segunda-feira (22), abandonaram tais locais devido à chuva.

Os citadinos, que segundo a alegação da edilidade de Nampula ergueram residências em sítios impróprios para o efeito, contaram que a destruição, desencadeada com recurso a buldózeres, iniciou por volta das 10h00 daquele sábado sob uma forte guarnição da Polícia Municipal, armada.

Alguns lesados disseram que se encontravam no local há dois anos e outros há cinco. As terras que eles ocuparam outrora eram campos de produção agrícola mas adquiriram-nos através aos supostos proprietários. A edilidade justifica a sua acção com o facto de os talhões estarem localizados debaixo de cabos de energia eléctrica e, também, por as casas estarem no traçado de uma estrada.

Contudo, em várias regiões de Moçambique, há inúmeros domicílios situados a poucos metros da estradas nacionais. Aliás, num país como o nosso, onde os reassentamentos são feitos inadequadamente e os cidadãos são quase abandonados à sua sorte em condições precárias e longe dos serviços básicos tais como saúde, educação e transporte, as pessoas recorrem a meios próprios para não dependerem de quem, pese embora tenha a obrigação de assegurar uma vida digna, pauta pela incúria.

Para além de habitações deitadas abaixo, há cidadãos que perderam barracas através das quais obtinham os seus meios de sobrevivência, e em muitos casos as demolições aconteceram na ausência das famílias afectadas.

Os lesados dizem que não dispõem de meios para reconstruírem as suas habitações. Eles gostariam de ver as suas propriedades repostos, até porque têm esse direito uma vez todo o indivíduo a quem retiram algo ilegitimamente deve ser ressarcido.

Face a esta situação que fez com que muita gente perdesse o que tinha ganho ao longo de vários anos de sacrifício, houve uma manifestação defronte das instalações do Conselho Municipal de Nampula. Contudo, os lesados, que se queixam de frio, foram tratados como bichos e reprimidos pela Polícia, que parece andar com o dedo no gatilho, além de não poupar esforços para disparar contra o povo, indefeso.

Uma das vítimas, que se identificou pelo nome de Maria Momade, é viúva e mãe de quatro filhos. Ela, como tantos outros vizinhos, naquela manhã viram as suas pequenas palhotas edificadas com base em estacas, caniço e maticada serem reduzidas a escombros sem poderem fazer nada, até porque mesmo se pudessem intervir para evitar a desgraça a que estão sujeitos neste momento corriam o risco de ser alvejados a tiro ou a acabar numa cela, disse que não sabe o que será dela e dos seus dependentes.

Maria, a par de outras famílias, queixa-se de falta de comida porque o pouco que tinha no seu domicílio ficou misturado com o entulho.

Anastácio Isidro, de 26 anos de idade, é outra vítima. Ele vive em Mutita desde 2013, ou seja, faz parte do grupo cujos talhões foram comprados há sensivelmente dois anos. Em Moçambique a terra é propriedade do Estado e não pode ser vendida, ou por qualquer outra forma, alienada, hipotecada ou penhorada.

Contudo, na prática, a distância entre o preceito que consta da Constituição da República e a realidade é deveras abismal. Regra geral, um pouco por todo o país, os cidadãos compram terrenos porque o Estado nunca esteve à altura de satisfazer ninguém relativamente à habitação, excepto certos indivíduos ligados a dirigentes políticos.

Num outro contexto, como meio universal de criação da riqueza e do bem-estar social, o uso e aproveitamento da terra é direito de todo o povo moçambicano, ainda segundo a Lei-Mãe, mas, na verdade, há gente que morre sem saber o que é ter um DUAT.

Anastácio é natural de Muecate e chegou a Nampula na companhia do irmão mais velho, antigo trabalhador da extinta ECMEP. Os dois procuravam melhores condições de vida, porque na zona de origem nada era fácil.

A principal fonte de rendimento daquele jovem era uma pequena barraca, construída de pau-a-pique e coberta de chapas de zinco. Todavia, naquele sábado, tudo foi destruído sem piedade. “Não tenho outra forma para sobreviver com a minha esposa e a minha filha”, lamentou a nossa fonte.

O pequeno José, aluno da 3ª classe na Escola Primária Completa de Mutauanha, contou-nos que não vai às aulas desde segunda-feira (22) porque o seu material didáctico ficou debaixo dos escombros da casa dos seus pais, ora arruinada.

Bonifácio Frâncico é um dos moradores de Mutita que possuía uma casa melhorada do tipo três, mas, desde sábado, e ele e a sua família passam as noites num sítio improvisado no posto administrativo de Muatala.

Nelson Mário, jovem de 23 anos de idade, narrou que tinha uma habitação precária com energia eléctrica. Encontrámo-lo a remover o entulho para tentar recuperar alguma coisa. Agora dorme numa tenda improvisada e deve arregaçar as mangas para recomeçar a vida.

Polícia violenta as vítimas

Os moradores de Mutita amotinaram-se no edifício municipal para perceber as causas que levaram à destruição dos seus bens, mas tal procedimento não agradou as autoridades, sobretudo da edilidade, que recorreram à Polícia Municipal e de Protecção para não prestarem esclarecimentos exigidos por quem se sentia injustiçado.

Depois de tanta violência, da qual os profissionais de comunicação social não escaparam, o Conselho Municipal de Nampula refreou a sua arrogância. O chefe do gabinete do presidente, Faizal Raímo, alegou que as famílias cujas infra-estruturas foram arrasadas ergueram instalações em locais impróprios, ao longo da estrada que liga a Escola Secundária de Muatala à sede do posto administrativo de Mutita e debaixo da linha de transporte de energia eléctrica.

A fonte assegurou que mais pessoas poderão ser abrangidas nos seis postos administrativos daquela região para se repor a ordem, uma vez que vários talhões foram ocupados desordenadamente.

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