A Convenção da União Africana (UA) sobre a Protecção e Assistência a Pessoas Deslocadas Internamente (IDPs) 2009, também conhecida como a Convenção de Kampala, entrou em vigor a 06 de Dezembro e é o primeiro instrumento do género a nível mundial, de cumprimento obrigatório que protege as pessoas deslocadas dentro dos seus próprios países.
Adoptada durante uma cimeira da UA em Kampala, a capital do Uganda, a Convenção necessitava da ratificação por pelo menos 15 países membros antes de entrar em vigor; a Swazilândia tornou-se o 15/o país a fazê-lo, a 12 de Novembro, juntando-se ao Benin, Burkina Faso, República Centro Africana, Chade, Gabão, Gâmbia, Guiné-Bissau, Lesotho, Níger, Nigéria, Serra Leoa, Togo, Uganda e Zâmbia.
Pelo menos 37 países membros da UA também assinaram o documento mas ainda não o ratificaram. Entre outras coisas, a Convenção pretende “estabelecer um quadro legal para prevenir o deslocamento interno, proteger e assistir os deslocados internos em África.”
O Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), António Guterres, saudou este desenvolvimento como “histórico” e disse em comunicado que a Convenção “coloca África numa posição de liderança quando se trata de ter um quadro legal para a protecção e apoio os deslocados internos.
Stephen Oola, analista de governação e justiça do Projecto de Lei dos Refugiados na Universidade de Makerere, disse que a parte mais importante da Convenção é a cláusula sobre a prevenção do deslocamento interno. “O princípio que exige a prevenção de IDPs é absolutamente necessário e deve ser o guia para todos os actores estatais e não estatais na implementação da Convenção”, disse ele.
Apenas o começo
Oola salientou também a necessidade de a letra da lei ser traduzida na prática. “No Uganda temos tido uma política de IDPs desde 2004, mas em muitos casos constatamos que o governo ainda parece pouco preparado para lidar com casos de deslocados”, disse ele, acrescentando que “a existência de uma lei é raramente a conclusão de uma política…será importante que este compromisso continental se traduza em acções no terreno para pessoas que, por uma ou outra razão se encontrem na situação de deslocados”.
O Continente africano tem 9,7 milhões de deslocados internos, segundo a ACNUR. A RDCongo, Somália e Sudão têm no conjunto mais de cinco milhões de IDPs. Observando que a situação dos deslocados internos pode afectar a estabilidade dos estados, o Relator Especial da ONU sobre os Direitos Humanos dos Deslocados, Chacola Beyani, disse que a Convenção pode “contribuir para estabilizar as populações deslocadas através de obrigações específicas que estabelece para os estados e outros actores, tais como a obrigação relacionada com assistência humanitária, compensação e assistência para encontrar soluções duradouras para o deslocamento interno, bem como avaliar toda a gama dos seus direitos humanos.”
“O valor acrescentado único” desta Convenção deriva de quão abrangente ela é e da maneira como ela aborda muitos dos desafios fundamentais dos nossos tempos e, na verdade, de África”, disse ele em comunicado. “Se for bem implementada, ela pode ajudar os estados e a UA a lidar tanto com os actuais como com futuros casos de deslocamento interno relacionados não apenas com conflitos, mas também com calamidades naturais e outros efeitos de mudanças climáticas, desenvolvimento, e mesmo grandes tendências tais como o rápido crescimento da urbanização.”
O Centro de Monitoria de Deslocamento Interno (IDMC) salienta que, enquanto a Convenção marca um importante passo para lidar com a situação dos deslocados, muitos países não estão legalmente obrigados por ela. “Os países que ainda não adoptaram a Convenção devem fazê-lo, porque um quadro legal é a principal base para garantir os direitos e bem-estar das pessoas forçadas a fugir dentro do seu próprio país,” disse em comunicado Sabastian Albuja, chefe do departamento africano da IDMC.
De acordo com Nuur Sheekh, membro da direcção do Centro de Advocacia e Políticas dos Deslocados Internos, baseado no Quénia, alguns estados mostraram reservas sobre a assinatura da Convenção porque “o assunto dos deslocados está altamente politizado, e alguns estados vêm como uma crítica aos relatórios sobre a sua governação e direitos humanos.”
Contudo, ele observou que a Convenção pode ter influência, mesmo naqueles países que não a assinaram ou ratificaram. “A UA vai agora também ser capaz de usar a Convenção para advocacia, para encorajar os estados membros – mesmo aqueles que não ratificaram – a implementar os seus princípios… O Quénia, por exemplo, não a assinou mas tem uma política dos deslocados que tem muito do que está contido na Convenção de Kampala,” disse ele à IRIN. “Agora os estados precisam adoptar a Convenção e desenvolver políticas internas de IDPs que partam do governo central até todos os níveis de governo para que ela possa funcionar na prática,” acrescentou Sheekh
