Uma adolescente foi violada sexualmente pelo marido da sua irmã, na passada terça-feira(05), na residência onde vivem há cerca de um ano no município de Catandica, no distrito de Bárue, na província de Manica. O violador, identificado pelo nome de Tarissai Chimera, foi entretanto detido mas porém poderá ficar impune porque só 48 horas após o crime, que tudo indica não ser a primeira vez que acontece, é que a vítima recebeu atendimento médico o que indicia a falta de provas para a instrução do respectivo processo criminal.
Era noite e Aida* dormia no seu quarto quando foi acordada pelo cunhado, um cidadão com mais de 30 anos de idade, empunhando uma faca e obrigo-a a despir-se e a manter relações sexuais. A sua irmã, a esposa de Tarassai, não se encontrava na residência pois fora passar a noite na casa de uma vizinha onde, por sugestão do marido, deveria ficar como guarda nocturna, em mais um dos biscates que realiza para a sua sobrevivência.
Terminada a violação a jovem, que é orfã de mãe e de pai, pediu ao seu violador que a deixasse sair para o exterior, pois pretendia fazer as suas necessidades maiores. Correu para a casa da vizinha, localizada a cerca de 500 metros, e relatou a violação que acabava de sofrer a irmã.
Em vez de conforto e apoio psicológico a adolescente foi intimidada pela irmã, sob ameaça de expulsa-la da sua casa, a não revelar o sucedido.
Novo Código Penal falha em proteger os menores que sofrem de violência sexual
Uma lacuna no novo Código Penal em vigor em Moçambique é que falha em proteger os menores que sofrem de violência sexual no entorno familiar, isentando “dos crimes de encobrimento os cônjuges e familiares, permitindo-lhes alterar ou desfazer os vestígios do crime com o propósito de impedir ou prejudicar a formação do corpo de delito, ocultar ou inutilizar as provas, os instrumentos ou os objectos do crime com o intuito de concorrer para a impunidade”, explica a Organização não governamental Mulher e Lei na África Austral (WLSA).
“Esta norma terá impacto negativo na investigação dos crimes de violência sexual contra menores, que as estatísticas demonstram que a maioria das vezes ocorrem num entorno familiar. Isentar de punição as pessoas que encobrem estes crimes, só por serem familiares, é uma forma de o legislador ser cúmplice da violação dos direitos das crianças e do menosprezo do princípio do superior interesse da criança” acrescenta a WLSA numa análise realizada pouco depois da Assembleia da República aprovar o novo Código Penal.
Inconformada, Aida, afinal esta era não foi a primeira vez que o seu cunhado a violava, procurou ajuda junto ao activista social e jornalista da Rádio Comunitária de Catandica que a acompanhou primeiro para a residência de uns tios e posteriormente todos dirigiram-se ao gabinete local de atendimento à mulher e criança vítimas de violência doméstica, no comando da Polícia da República de Moçambique em Bárue, onde foi apresentada a queixa.
Antes a adolescente procurou atendimento médico mas não conseguiu por ausência do profissional de saúde que deveria estar de serviço. Entretanto Aida foi acolhida pelos tios, em segundo grau.
Dois dias após a violação conseguiu enfim ser atendida por um profissional de saúde que confirmou apenas que ela não é virgem sem contudo encontrar eventuais provas da violação, como secreções vaginais para avaliação médico-legal. No centro de saúde a adolescente ficou a saber que não contraiu nenhum doença de transmissão sexual e nem está grávida, embora não se recorde se o violador usou preservativo ou não.
Violador tentou estuprar outra parente da vítima
Ao abrigo do novo Código Penal, Tarissai poderia ser julgado e condenado a uma pena que varia entre 20 a 24 anos de prisão maior, de acordo com o artigo 219. Contudo a ausência de provas materiais poderá beneficiar o violador que além destas penas incorre em “agravação especial”, artigo 222, que refere que se se provar que “Nos crimes de que trata esta secção, as penas serão substituídas pelas imediatamente superiores, se: a) o agente for ascendente, adoptante ou irmão da pessoa ofendida; b) o agente for tutor, curador, mestre ou professor dessa pessoa, ou por qualquer título tiver autoridade sobre ela; ou for encarregado da sua educação, direcção ou guarda; ou for ministro de qualquer culto, ou servidor público de cujas funções dependa negócio ou pretensão da pessoa ofendida; c) o agente for empregado doméstico da pessoa ofendida ou da sua família, ou, em razão de profissão, que exija título, tiver influência sobre a mesma pessoas ofendida; d) do crime resultar gravidez; e) do crime resultar doença ou infecção de transmissão sexual; f) se a violação for cometida com ameaça de arma de fogo ou branca” e ainda se verificar-se “a transmissão de HIV e SIDA pelo agente ao ofendido, nos crimes de que trata esta secção, as penas agravadas nos termos do número anterior serão substituídas pelas imediatamente superiores.”
Ademais o artigo 249, do novo Código Penal, penaliza “1. Aquele que, consciente do seu estado infeccioso, mantiver coito consentido ou não consentido, com mulher ou homem com quem tem ou teve uma relação, laços de parentesco ou consanguinidade ou com quem viva no mesmo espaço, transmitindo-lhe doença ou infecção de transmissão sexual, é punido com pena de prisão maior de dois a oito anos, sendo a pena mínima elevada a três anos; 2. Se do coito resultar a transmissão de vírus de imunodeficiência adquirida, a pena é de oito a doze anos de prisão maior.”
Tarissai Chimbera, que é casado com a irmã de Aida com quem tem dois filhos, um de 4 anos e outro de 5 meses de idade, foi confrontado com a denúncia e admitiu ter tido uma relação sexual não consentida com a adolescente mas não este ano, um pouco antes do mês de Dezembro de 2015. Entretanto a Polícia da República de Moçambique deteve-o enquanto aguarda julgamento.
No seguimento da denúncia e detenção a tia que agora acolhe Aida, um cidadã com mais de 40 anos de idade, revelou ter sofrido uma tentativa de abuso sexual por parte de Tarissai que, numa noite em que este se apercebeu que o seu marido não estaria em casa, tentou consumar os seus apetites sexuais, porém sem sucesso.
* nome fictício para para protecção da menor.
** Artigo escrito com recolha de John Chekwa