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Sem aulas para prevenir covid-19, crianças tornam-se vendedores nas ruas e mercados da Cidade de Chimoio

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Uma semana depois da 3ª vaga da pandemia aparentar ter atingido o pico explodiram novos surtos na Cidade do Chimoio onde milhares de crianças que não vão a escola, cumprindo uma das medidas de prevenção da propagação do novo coronavírus, transformaram-se em vendedores nas ruas e mercados. “Estou a trabalhar para uma senhora nossa vizinha e recebo por dia 75 Meticais” contou a adolescente Filomena enquanto vende biscoitos. Já um dos primeiros profissionais de saúde a testar positivo para a covid-19 recorda-se como a família e colegas “não só temiam o contágio pela doença, mas simplesmente não queriam saber de mim”.

Após duas vagas relativamente suaves– até Fevereiro foram registados pouco mais de 2 mil infectados com cinco vítimas mortais – a Província de Manica está a ser uma das mais atingidas pela 3ª vaga da pandemia respiratória que infectou quase 6 mil indivíduos até esta semana e originou 25 óbitos com epicentro na capital provincial.

Na Cidade do Chimoio o cumprimento de uma das principais medidas governamentais para mitigar o impacto da covid-19 tornou ainda mais insegura a vida de milhares de petizes que não podem ir a escola e tornaram-se vendedores informais – nas avenidas de Trabalho, Liberdade e 25 de Setembro, e nos mercados grossistas Francisco Manyanga Feira, Josina Machel e Catanga – para ajudar no apertado orçamento familiar.

“Antes das aulas encerrarem só vinha a tarde, por que estudo de manhã” começa por contar Marta, órfã de pais que todos os dias pelas 6 horas deixa a casa dos familiares para vender doce de coco pelas ruas da cidade. A adolescente de 14 anos de idade explicou “vivo com o meu avô, a minha tia e o meu irmão” e o “dinheiro da venda de doce de coco ajuda no sustento da casa”, cuja renda é constituída pelo magro salário da tia que é emprega doméstica e pela miserável pensão de velhice que o avô recebe irregularmente do Instituto Nacional da Acção Social.

A estudante da 6ª classe disse ao @Verdade que desde que as aulas foram suspensas neste ano lectivo não recebeu nenhum trabalho da Escola Primária Completa de Nhamaonha e não tem meios para acompanhar as aulas ministradas na televisão, “não temos televisão em casa, por isso não assisto telescola”.

Vendedor ambulante a mando do irmão mais velho

Outro aluno da 6ª classe na Escola Primária Completa de Nhamaonha, João, confidenciou que tornou-se vendedor ambulante de pedaços de frango frito, vulgarmente denominado petisco, “a mando do meu irmão mais velho”.

“Moro no bairro 16 de Junho com o meu irmão, a minha cunhada e a minha sobrinha” relatou o adolescente de 12 anos de idade que se vangloria de “nos dias de bom movimento ganho uns 400 meticais” vendendo principalmente nas imediações do mercado Josina Machel, local para o qual tem de caminhar cerca de 5 quilómetros desde a residência da família.

“Não nos deram fichas com trabalhos nem exercícios para fazer em casa”

Outra estudante entrevistada pelo @Verdade é Filomena, moradora do Bairro-5 Makhodamo, que vende biscoitos, “estou a trabalhar para uma senhora nossa vizinha e recebo por dia 75 Meticais”.

“Lá em casa somos três, eu e os meus pais” declarou a adolescente de 15 anos de idade, estudante na 7ª classe na Escola Primária de Trangapasso, clarificando que tem de ajudar nas despesas porque o salário do pai que é guarda “é pouco e a minha mãe é camponesa”.

Sobre o subsídio da covid-19 que o Instituto Nacional de Acção Social está a dar às famílias mais carenciadas a rapariga afirmou “não recebemos lá em casa”.

Filomena, a semelhança de muitos estudantes que foram impedidos de ir a escola pelo Governo como forma de minimizar o impacto da 3ª vaga da pandemia da covid-19, também não está a estudar em casa. “Não nos deram fichas com trabalhos nem exercícios para fazer em casa. Nesta classe tenho exames e não sei como vamos fazer”, lamentou.

“Com o dinheiro ajudo o papá a fazer despesas em casa”

Por seu turno António, de 13 anos de idade, usa o tempo que tem por não frequentar as aulas da 7ª classe na Escola Primária Completa Bengo na praça da Independência polindo sapatos. “O meu pai é quem me chamou para vir aprender o serviço de escovar sapatos, assim estou a ajudar-lhe” segredou ao @Verdade.

“Com o dinheiro ajudo o papá a fazer despesas em casa, por que somos 12 pessoas lá em casa”, detalhou o menino que trabalha de segunda ao sábado, das 6 horas da manhã até ao princípio do fim da tarde, contudo “assisto a telescola aos sábados”, no entanto pouco serve para manter os estudos, “ainda não recebi nenhum trabalho nem ficha da escola e não sei se havemos de receber”, sentenciou.

“Não só temiam o contágio pela doença, mas simplesmente não queriam saber de mim”

O @Verdade encontrou o primeiro profissional do Hospital Provincial de Chimoio a apanhar o novo coronavírus, Aniceto Nhamayao recordou emocionado “foi a 3 de Novembro que testei positivo para a covid, submeteram-me a quarentena e felizmente estou aqui”.

“Durante o período todo, desde pós teste à quarentena, infelizmente não tive boas relações com os colegas, amigos e até familiares”, lamentou Nhamayao, “eles parece que tinham a sensação de ter contacto com um cadáver, sinceramente falando, não só temiam o contágio pela doença, mas simplesmente não queriam saber de mim”.

O jovem profissional de saúde desabafou ainda “hoje se a memória não me atraiçoa, mais da metade dos funcionários do hospital provincial, falo de médicos, enfermeiros, serventes até ao pessoal administrativo já devem ter contraído a covid, uns tal como eu já recuperados e outros nem por isso”.

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