É triste a situação que muitos compatriotas moçambicanos vivem em algumas cidades do país, principalmente nas cidades de Maputo, Matola e Beira. Sempre que a época chuvosa começa a media nos brinda com informações sobre irmãos moçambicanos que dormem por cima das mesas, em outros casos nem dormem e reclamam ter perdido tudo ou quase tudo porque as suas casas ficaram alagadas.
Todos os anos “gastam-se rios de dinheiro” para socorrer as vítimas das inundações, dinheiro este que podia servir para solucionar outros inúmeros problemas. Nesse trabalho “circular”, penso que o Instituto Nacional de Gestão de Calamidades – INGC, faz as suas tarefas e muito bem, no entanto, há questões (como determinar o lugar ideal para viver) que não são da sua competência resolvê-las, esta reflexão cabe aos municípios e aos munícipes.
Quando chove as casas ficam inundadas, o INGC intervém e criam- se centros de acomodação provisórios para acolher as vítimas das inundações. Sou da opinião de que já está mais do que na hora dos municípios e os munícipes começarem a pensar seriamente em como evitar que a mesma situação se repita com as mesmas pessoas ou nos mesmos bairros.
Esta reflexão passa por identificar novos espaços ordenados que não são propensos a inundações e com todos serviços básicos reunidos para as vítimas fixarem as suas residências.
Para além do ordenamento, os novos espaços devem passar por estudos que garantam a fiabilidade da solo para fixar habitações, significa que não é só identificar um espaço “vazio” e colocar lá as pessoas, sob o risco do lugar não ser apropriado para habitação e de novo os choros.
O facto é que os centros de acomodação funcionam por um período e depois de a chuva parar, a água “baixa” e os mesmos munícipes ou outros voltam para os mesmos sítios que fugiram a tempos atrás e permanecem ai até chegar a próxima chuva. Em outros casos essas vítimas recebem novos espaços e sem pestanejar vendem esses terrenos.
Gostamos de sofrer.
Compatriotas, não podemos colocar o INGC a trabalhar num ciclo vicioso todos os anos, envolvendo as mesmas pessoas ou os mesmos bairros. A instituição vai trabalhar sempre que estivermos em apuros porque foi criada para isso mas, se não gostamos de sofrer há que mudarmos de mentalidade para darmos espaço de intervenção em outros problemas.
Que abandonemos esses espaços propensos a inundações. São lugares que enquanto não estiverem devidamente preparados para habitarem pessoas em todos períodos, sinceramente, penso que poderíamos praticar agricultura e contribuir para o aumento de comida disponível para o povo.
A culpa não é só do conselho municipal, nós é que as vezes saímos do “campo” para as cidades e construímos palhotas que depois transformam-se em casas grandes em lugares impróprios, porque queremos viver na cidade.
E porque quase sempre começamos por uma “casinha de nada”, o conselho municipal não leva em conta mas, as “casinhas” vão aumentando até transformarmos aquele lugar em um bairro populoso com problemas sérios de transitabilidade, porque queremos viver na cidade.
Consequência, origina-se o desordenamento territorial e como sempre, o município percebe a necessidade de estruturar a zona quando a bagunça estiver bem arrumada, porque todos queremos viver na cidade.
Há que antecipar o ordenamento territorial para melhor ocupação da terra, por mim, todo o território que faz parte do município devia estar sempre ordenado e pronto para receber habitantes.
Todos queremos viver na cidade, sim. Mas há que ter em conta a qualidade de vida nesse lugar e esse é o problema. No momento de construirmos nas cidades não pensamos no amanha, o que interessa é estar na cidade, não importam os riscos, os constrangimentos, etc.
Todos queremos viver na cidade, não é a toa que a cidade fica cheia de tudo que não é desejável como a mendicidade (fora da cidade não existem mendigos), o mendigo prefere viver por baixo da ponte ou no passeio mas estando na cidade.
Todos queremos viver na cidade, é lá onde estão as oportunidades.
Na capital do país a chuva caiu e em pouco tempo inundou casas, provocou o desabamento de uma montanha de lixo e causou a morte de pessoas mas, há problema de falta de água porque a chuva que cai ainda não é suficiente para encher os rios e reservatórios.
Isso leva-me a pensar que a questão das inundações nos bairros das nossas cidades não tem a ver, essencialmente, com a quantidade de chuva que cai mas, com a forma (desordenada) que construímos e o tipo de superfície onde construímos as nossas casas.
Todos queremos viver na cidade, no entanto, é necessário percebermos que: do mesmo modo que “nem sempre ter muita comida significa comer bem”, também, “nem sempre ter as cidades cheias de pessoas significa desenvolvimento urbano”, é necessário organizar-se.
Todos nós queremos viver na cidade mas, é interessante perceber que quase ninguém de nós que vivemos nas cidades tem as suas origens ligadas a cidade.
Terminando ficam essas três questões para reflexão:
Como não ficarmos com as casas alagas se nem espaço para a água escorrer nós não deixamos quando construímos?
Como não ficarmos com as casas submersas se o solo onde construímos tem pouco poder de absorção da água?
Será que não cansamos de sermos vítimas de inundações todos os anos, mesmo tendo terra não só nas nossas zonas de origem mas em todo o território nacional e que nunca foi habitada? Não tenho vergonha, vim do distrito, nasci no mato com muito orgulho.
Por Nelson Cossa
