A astronomia abriu nesta quinta-feira uma nova janela no universo com o anúncio de um desses marcos científicos que se esperam durante décadas: a primeira detecção direta das ondas gravitacionais previstas por Albert Einstein há 100 anos em sua Teoria da Relatividade geral.
Numa grande entrevista colectiva em Washington, os cientistas do Observatório Americano de Interferometria Laser (LIGO) puseram fim a meses de rumores e grande expectativa entre a comunidade científica perante um achado que abre o caminho para se redescobrir o universo, desta vez, sem necessidade da luz.
“Senhoras e senhores, detectamos as ondas gravitacionais. Conseguimos”, anunciou com orgulho o diretor-executivo do LIGO, David Reitze, que recebeu uma grande ovação em uma sala abarrotada de cientistas e jornalistas.
O feito do LIGO é duplo: se trata da primeira detecção direta de ondas gravitacionais e da primeira observação da fusão de um sistema binário de buracos negros.
Os físicos concluíram que as ondas gravitacionais detectadas se produziram durante a fração final de um segundo da fusão de dois buracos negros em um mais massivo. Essa colisão de dois buracos negros tinha sido prevista, mas nunca observada.
O choque ocorreu a uma distância de mais de um bilião de anos-luz, de modo que os detectores do LIGO observaram um evento que ocorreu em um tempo e uma galáxia muito distantes.
“Demoramos meses para constatar que realmente eram as ondas gravitacionais. Mas o que é verdadeiramente emocionante é o que vem depois, abrimos uma nova janela no universo”, anunciou Reitze entusiasmado.
As ondas foram detectadas às 9h51 GMT do último dia 14 de Setembro pelos dois detectores do LIGO, um localizado em Livingston (Louisiana) e outro em Hanford (Washington), a milhares de quilómetros de distância.
O Comité de Detecção do LIGO, uma equipe de cientistas experientes, passou mais de quatro meses apurando a descoberta para confirmar que o sinal provinha do céu e não uma de fonte na Terra ou de uma falha instrumental. O achado foi possível graças ao aumento da sensibilidade dos instrumentos em 2015, em comparação com a primeira geração de detectores LIGO.
“A nossa observação das ondas gravitacionais cumpre um ambicioso objectivo estabelecido há cinco décadas para detectar de maneira directa este fenómeno e entender melhor o universo”, explicou Reitze. “Além disso, completamos o legado de Einstein no centenário de sua Teoria da Relatividade geral”, acrescentou.
A entrevista coletiva do grande anúncio abarrotou como poucas vezes o National Press Club de Washington, com centenas de jornalistas e cientistas que, na longa fila antes de entrar, se prodigalizavam em felicitações “por isso do que ainda não podemos falar”.
A expectativa foi tal que mais de 90.000 pessoas seguiram o evento ao vivo através da internet, as reacções se multiplicaram por todo o mundo e as redes sociais se inundaram de ciência por um dia.
Einstein descobriu na sua Teoria da Relatividade geral que os objectos que se movimentam no universo produzem ondulações no espaço-tempo e que estas se propagam pelo espaço. Predizia assim as ondas gravitacionais, mas demonstrar de maneira directa a sua existência era o último desafio pendente.
Durante décadas os astrónomos acumularam evidências claras de que as ondas gravitacionais podiam existir, e no ano 2000 já se dispunha de um conjunto completo de interferômetros: TAMA300 no Japão, GEO600 na Alemanha, LIGO nos Estados Unidos da América e Virgo na Itália.
Entre 2002 e 2011 foram feitas sem sucesso observações conjuntas, mas o grande achado não chegou até 2015, quando os detectores do LIGO se incrementaram e começaram a operar como “Advanced LIGO”: o primeiro de uma rede global de detectores significativamente mais sensíveis.
O LIGO, composto por esses dois enormes interferômetros laser, é o maior observatório de ondas gravitacionais e um dos experimentos da física mais sofisticados do mundo. O laboratório usa as propriedades físicas da luz e do espaço para detectar as ondas gravitacionais, um conceito proposto pela primeira vez nas décadas de 1960 e 1970.
A descoberta abre uma nova porta na astronomia, porque até agora os cientistas dependeram de diferentes formas de luz (ondas eletromagnéticas) para observar o universo.
As ondas gravitacionais, por sua vez, transportam informação sobre o movimento dos objetos no universo e espera-se que permitam observar a história do Cosmos até instantes remotos. A grande descoberta que representa a detecção destas ondas encerra a promessa do desconhecido: poder olhar o universo com um novo par de olhos que não dependem da luz.