O declínio no número de meninas indianas, causado pelo aborto ilegal de milhões de bebés, alcançou “proporções de emergência”, motivando um aumento de crimes como sequestros e tráfico de pessoas, alertou a Organização das Nações Unidas (ONU) nesta terça-feira. Apesar de leis que proíbem pais de realizar testes para determinar o género dos seus filhos ainda em gestação, o feticídio feminino permanece uma prática comum em partes da Índia, onde a preferência por filhos homens é muito maior.
“É tragicamente irónico que o mesmo género que cria a vida tenha negado o direito de nascer”, disse Lakshmi Puri, vice-diretora-executiva da ONU Mulheres, durante lançamento de um novo estudo sobre proporções de sexos e selecção orientada por género.
A cultura da Índia, tradicionalmente dominada por homens, vê os meninos como ativos – provedores que irão sustentar a família, carregar o nome da família, e realizar os últimos rituais para seus pais, algo importante em muitas religiões. As meninas, no entanto, são frequentemente vistas como um passivo, e as suas famílias precisam procurar consideráveis recursos para pagar o dote para que tenham um casamento desejável.
Numa cultura que olha para o sexo antes do casamento, por parte de uma mulher, como uma vergonha para a família, os pais também preocupam-se com a segurança delas.
O censo de 2011 da Índia mostrou que, embora a proporção geral entre mulheres e homens tenha melhorado marginalmente desde o último censo, realizado há uma década, nasceram menos meninas do que meninos, e o número de garotas com menos de 6 anos caiu pela quinta década seguida. “A aguda queda da proporção dos sexos na Índia alcançou proporções de emergência, e acção urgente deve ser tomada para aliviar essa crise”, disse Puri.
Um estudo de maio de 2011 publicado no periódico de medicina britânico Lancet descobriu que houve aborto de cerca de 12 milhões de fetos do sexo feminino nas últimas três décadas, resultando em uma proporção de 918 garotas para cada 1.000 garotos em 2011, ante 962 em 1981.
Activistas culpam a ultrassonografia pelo aumento nos abortos, dizendo que a tecnologia é utilizada para descobrir o sexo dos filhos, o que é proibido. Mas é um crime difícil de fiscalizar, dizem eles, resultando em poucas condenações. Houve 221 casos de feticídio registrados em 2013, enquanto em 2012 eram 210, segundo a Agência Nacional de Registro de Crimes.