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Anadarko da República de Moçambique

O Governo tem, ao que tudo indica, um novo orgão de tutela ambiental. Chama­-se Anadarko e aparentemente é uma instituição bem mais competente do que o MICOA no que à fiscalização das actividades das empresas do seu sector diz respeito.

Ao contrário do MICOA, a Anadarko detectou um problema na sua prospecção de gás na Bacia do Rovuma. Ou seja, em menos de um ano de operação num único empreendimento, a Anadarko detectou uma irregularidade a mais do que o MICOA numa vida inteira em Moçambique de lés a lés.

É obra! Para tornar a situação mais bizarra e tornar a já pouca credibilidade do MICOA num total motivo de chacota, foi tornado público que foi a Anadarko quem comunicou ao MICOA o derrame, em vez de deixarem desportivamente o MICOA arcar com os louros do triste achado para ao menos poderem dizer que estava lá a fazer o seu trabalho quando ocorreu.

Brincadeiras à parte, até porque apesar dos contornos surreais o assunto é bastante sério, se há uma lição a aprender com esta história (para os menos atentos claro – o que infelizmente pode incluir também os responsáveis por investimentos do género em Moçambique, como a Anadarko), essa lição é: o MICOA não controla nada, não fiscaliza nada, não sabe de coisa alguma.

É uma instituição fantasma, uma mera formalidade, é apenas e somente um requisito burocrático facilmente contornável que serve para legitimar o estupro ambiental que vai permitindo a meia dúzia de moçambicanos enriquecer selvaticamente saqueando os recursos que são de todos nós. Se isto não é verdade, como se justificam certos mega empreendimentos a operar no país sem EIAs?

Como se justifica todo o secretismo por detrás das participações moçambicanas nesses investimentos? Como se justificam as discrepâncias entre o volume de madeira que declaramos exportar e o que quem a importa declara?

Como se justifica o sofrimento de milhares de moçambicanos perante a inacção de um estado que prontamente deporta estrangeiros por palavras inapropriadas mas parece resignado a condenar comunidades rurais inteiras à miséria absoluta para salvaguardar os interesses de corporações estrangeiras cujo comportamento inaceitável vai muito além das palavras? O MICOA é uma loja onde se vende Moçambique.

Quanto às consequências da lição aprendida de que falávamos, essas são tão óbvias quão tristes: virá a público dizer que aconteceu A ou B. Pois não se iludam, se a Anadarko comunicou ao MICOA o ocorrido, não foi da bondade do seu coração, foi para se proteger e minimizar o “estrago” que o acidente poderia causar à sua imagem pública caso o derrame viesse a público por outra via.

Sobre a ética de trabalho da Anadarko, escreveu Marcelo Mosse no mediaFAX de 26 de Maio um artigo bastante contundente, intitulado: Porque é que a Anadarko atirou o lixo ao mar?

Um “investidor passivo” com responsabilidades no derrame do Golfo do México. descreve o envolvimento da Anadarko no tristemente célebre derrame da BP no Golfo do México (por sinal o maior da história dos EUA) e deixando bastante clara a índole e os princípios pelos quais se pauta esta gigante americana em cuja boa vontade e honestidade estamos a depositar no nosso mar.

“Se eles dizem que foram 30.000 é porque foram 30.000.” Certo? A segunda e final consequência da nossa política de investimento no sector extractivo, da nossa fiscalização e monitoramento deficitários dos investimentos existentes no sector, da nossa permeabilidade à corrupção, da nossa ganância em querermos fazer mais do que estamos preparados para fazer e da nossa aparente confiança na boa vontade de corporações estrangeiras vai ser o adeus a Cabo Delgado como o conhecemos hoje. Adeus praias e adeus mar e tudo e todos os que vivem nele e dele.

E depois vai acabar o gás…

No passado dia 29 de Maio, A JA! em parceria com a Liga dos Direitos Humanos (LDH),enviaram uma carta (REF. 42/JA/14) à Direcção Nacional de Avaliação do Impacto Ambiental (DNAIA) do MICOA a solicitar informação sobre o derrame ocorrido na Bacia do Rovuma, nomeadamente os relatórios técnicos do incidente e a alertar para a evidente e chocante falta de capacidade e preparação do MICOA para este tipo de incidente.

A 4 de Junho, recebemos da DNAIA (REF. 749 MICOA/DNAIA/189/14) uma resposta vaga e desprovida de qualquer informação útil, onde referia que decorre ainda a elaboração do relatório e que oportunamente teremos o informe. Face a esta resposta a JA e a LDH endereçaram a 23 de Junho uma nova carta (REF. 46/JA/14) ao MICOA, agora dirigida à Sra. Ministra do MICOA com o conhecimento do Ministério dos Recursos Minerais e da DNAIA a solicitar novamente informação detalhada sobre o incidente, nomeadamente:

Relatório independente de avaliação sobre o derrame, Informação sobre os preliminares e concretos impactos humanos, ambientais e marinhos;

Informação sobre as medidas tomadas pelo MICOA para apurar as necessárias responsabilidades da Anadarko;

Informação detalhada sobre as medidas de mitigação de impactos a ser postas em prática;

Exigimos ainda a criação de uma comissão independente para avaliar este incidente.

De momento aguardamos a resposta das instituições contactadas e acima de tudo aguardamos pela disponibilização dos documentos solicitados.

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