Nos últimos 30 anos da sua existência, a Escola Nacional de Música pode ter sido a contradição de si mesma enquanto um projecto, efectivamente, de âmbito nacional. É que por causa da sua localização em Maputo – sul de Moçambique – ela continua muito longe de ser o que se diz dela. Mas há outros factores que explicam o facto.
No passado dia 1 de Outubro, a Escola Nacional de Música completou três décadas da sua existência e, em virtude disso, promoveu um concerto musical no Centro Cultural Franco-Moçambicano para celebrar. Esta instituição é a primeira que – no nosso país – se configurou como uma espaço de reflexão académica e produção de um dos bens mais sublimes que a humanidade possui – a música.
São três décadas de ensino musical que, em certo sentido, representam um esforço recheado de muitas lacunas mesmo a partir da dimensão que a mesma se diz possuir. E, por causa disso, há muitos moçambicanos que – nos últimos 30 anos – ainda que tenham talento musical, sonhos e projectos em relação a uma carreira musical se viram impelidos a fazê-lo de uma forma empírica já que não podiam cursar naquela instituição.
A Escola Nacional de Música continua inacessível para os moçambicanos, não necessariamente porque se encontra na cidade de Maputo, mas porque ela não possui delegações nas três regiões do país, o que – ao longo dos anos em celebração – determinou que quem quisesse aprender música tivesse de se deslocar até à capital do país. A falta de políticas concretas para a expansão da Escola Nacional de Música – contrariando o próprio nome da instituição – constitui um grande desafio para que contribua de modo mais alargado na formação de músicos em todo o país.
Como Filipe da Conceição Fumo, professor de bateria e trombeta, explica é irrecusável que a Escola Nacional de Música cresceu. O problema é que, ao longo dos anos, ela não conseguiu gerir as dificuldades com que deparou. Por isso, o crescimento dos obstáculos que possui é maior que a sua evolução. Mesmo tendo-se em consideração nomes como Tânia Tomé, Moreira Chonguiça, Ivan Mazuze, entre outros artistas moçambicanos de nomeada que deram os seus primeiros passos naquela instituição de ensino técnico.
Pretende-se que estas festividades espelhem efectivamente o tempo que passou e, em certo grau, os feitos da instituição. É por essa razão que o mérito da Escola Nacional de Música se conquista “ensinando a música com arte e fazê-la com cultura”. Trata-se de um mote que, na prática, só peca que ter uma dose de utopia. Afinal, como Filipe Fumo considera, parte da desorientação que nessa academia ocorreu deveu-se às transformações ocorridas ao nível do sistema de governação.
É que se no primeiro mandato do Presidente da República, Armando Emílio Guebuza os pelouros da Educação e Cultura estavam aglutinados na mesma instituição, no início do segundo, restruturou-se o Governo separando-se aquelas instituições uma da outra. E a Escola Nacional de Música – que lida com o ensino e a educação da produção músico-cultural – teve de experimentar dificuldades características do renascimento do Ministério da Cultura ao qual passou, exclusivamente, a pertencer.
De acordo com Filipe da Conceição, tais transformações, além de confundirem, desestabilizaram o processo de ensino na Escola Nacional de Música por falta de um acompanhamento adequado, muito em particular porque não se tinha a definição exacta do pelouro a que pertenceria a instituição. Da Conceição acredita que outras instituições de ensino superior – como, por exemplo, a Escola de Comunicação e Arte e o Instituto Superior de Artes e Cultura – que leccionam as artes e a gestão cultural inspiraram-se, em certo grau, no trabalho feito pela Escola Nacional de Música. Afinal, esta, com o ensino de música, já havia criado uma base a partir da qual se podia criar uma plataforma mais alargada em que os estudantes prosseguem a sua formação.
É em consequência destas transformações que o docente acredita que as demais instituições de nível superior acabaram por dar resposta à pergunta – para onde é que serão destinados os alunos formados naquela escola? Eles podem dar continuidade à carreira estudantil ou optar por seguir a música como profissão. Ora, se se considerar que a Escola Nacional de Música é de nível básico, constata-se que se está diante de uma situação problemática. Os alunos ali formados não podem ingressar no ensino superior sem, antes de mais, concluírem o nível médio. Criar esse nível é um dos grandes desafios da referida escola.
Felipe Fumo explica que foi a partir de alguns artistas que passaram por ali – considerados músicos de palco – que a sociedade moçambicana percebeu o valore da Escola Nacional de Música. Não obstante, não deixa de criticar algumas correntes de opinião que só vê brincadeiras no trabalho artístico. O problema é que, infelizmente, a sociedade moçambicana só considera profissionais apenas as pessoas formadas em medicina ou os políticos, excluindo as pessoas com uma especialidade – mesmo que seja de nível superior – na área das artes.
Espera-se que estes 30 anos sejam um momento não só de celebração como também de reflexão em volta da missão que a Escola Nacional de Música possui. Pretende-se que a escola evolua em aspectos que têm a ver com a qualidade do ensino, expandindo- se para outras regiões do país, bem como as suas infra-estruturas.