Os moçambicanos apresentam um baixo nível de apoio à democracia, não obstante o aumento percentual do número de cidadãos que apoiam este regime de governação. O facto foi revelado esta terça-feira, em Maputo, durante a divulgação do inquérito feito pelo Afrobarómetro, um projecto que mede o ambiente social, político e económico em África, representado em Moçambique pelo Centro de Pesquisa sobre Governação e Desenvolvimento (CPGD).
Embora Moçambique tenha registado um avanço de nove porcento, passando de 54 porcento de apoiantes em 2002 para 63 em 2012, o seu nível de apoio popular à democracia continua aquém do ideal, se comparado com o de outros países de África, onde foi feito um estudo similar.
Os resultados desta pesquisa, na qual foram inquiridos 2.400 cidadãos de ambos os sexos e de diferentes níveis académicos, indicam ainda que 29 porcento dos cidadãos são alienados políticos, isto é, não se importam com o tipo de governação vigente e 19 porcento consideram que, em certas circunstâncias, “um governo não democrático é preferível.” Entretanto, na explicação do director e pesquisador do CPGD, Carlos Shenga, o fraco apoio à democracia explica-se pelo facto de a “elite política moçambicana” não estar comprometida com o processo de democratização do país.
Aliás, esta falta de compromisso, por parte dos “políticos moçambicanos”, está explícito na Constituição da República quando esta estabelece que o Chefe do Governo, que chefia também o Estado, não é quem presta contas à Assembleia da República sobre a sua governação. Essa responsabilidade é atribuída à figura do Primeiro-Ministro, que em termos práticos não exerce outra função a não ser de auxiliar o Presidente da República.
Das explicações colhidas sobre esta fraca adesão a democracia depreende-se que o actual funcionamento Comissão Nacional de Eleições (CNE) tem também influência na percepção das pessoas sobre a democracia. É que este órgão, pelo seu carácter e imperativos da lei, devia ser totalmente imparcial, pois é responsável por administrar os pleitos eleitorais que, na visão dos cidadãos, são a face mais visível da democracia.
Porém, a CNE é deveras parcial no seu funcionamento e não garante o exercício de eleições livres, justas e transparentes. Aliás, o director da CPGD observa que o facto de a composição da CNE basear-se na representação proporcional dos partidos com assento no Parlamento alarga o poder de uma das forças política em prejuízo das outras.
Insatisfeitos com exercício da democracia
O estudo revela também que os cidadãos moçambicanos estão insatisfeitos com a forma como o regime democrático é implementado no país. Actualmente, apenas 12 e 23 porcento da população moçambicana está, respectivamente, satisfeita e muito satisfeita com a forma como a democracia funciona no país. Os restantes 65 porcento dividem-se entre os que estão pouco ou nada satisfeitos. O nível de insatisfação é cada vez mais crescente. De 2002 a 2012 a percentagem dos que se dizem satisfeitos baixou de 35 para 12 porcento, aponta.
Contudo, o cenário revela-se mais preocupante, pois, embora não se avance os motivos desta insatisfação, a pesquisa aponta que dos 2.400 cidadãos inquiridos, mais da metade afirma que Moçambique tem uma democracia problemática.
Liberdades
O estudo que temos vindo a fazer referência concluiu que o número de cidadãos que consideram que em Moçambique há liberdades de expressão e filiação em organização política está abaixo de 50 porcento, sendo que essa impressão se agudizou nos últimos quatro anos.
Entretanto, a liberdade de votar sem se sentir pressionado está acima da metade. Relativamente à liberdade de expressão, Shenga avança que a percepção dos cidadãos pode estar relacionada com a forma violenta com que a polícia moçambicana actua, em casos, por exemplo, de repressão de manifestação, mesmo as pacíficas.
Sobre a filiação partidária em organizações políticas apenas 46 porcento acredita que existe uma liberdade completa. Mesmo assim, a tendência é de baixar pois em 2008 essa percentagem atingia os 50 porcento. A pesquisa aponta que a maior parte dos moçambicanos, 64 porcento, teme em falar livremente sobre assuntos políticos.
Por outro lado, no diz respeito ao tratamento perante a lei, a ideia de que há desigualdades está a ganhar cada vez mais espaço, tendo registado uma subida de 33 porcento em 2002 para 49 porcento em 2012 o número de cidadãos que defendem essa posição. Não obstante este cenário, os inquiridos entendem que actualmente existe alguma democracia comparativamente há 10 anos e no período monopartidário havia muito menos democracia.
Assim, apesar da insatisfação que reina em relação a processo democrático de Moçambique, a população “é optimista em relação ao futuro da democracia no país.”