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O drama das chuvas na capital de Moçambique

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Há males que vêem por bem, a chuva torrencial que se abateu pela região sul do país, sobretudo, nas cidades de Maputo e Matola, deixou a descoberto o problema causado pelo deficitário sistema de esgoto na capital do país, enquanto do outro lado da cidade, as ruas e residências cederam ao alagamento, deixando famílias ao relento.

A queda das chuvas deixou uma sensação de reedição das cheias registadas na entrada do novo milénio, o ano 2000, em que dezenas de milhares de famílias ficaram desalojadas, perderam os seus bens, nas mais extremas consequências houve casos de mortes, sobretudo de crianças que foram arrastadas pela corrente das águas. Aquele foi um cenário que anunciava um aparente fim do mundo.

As chuvas registadas esta semana foram as primeiras de 2012 pelo menos na província de Maputo. A pluviosidade começou na manhã de segunda-feira, durante todo o dia ia caindo de forma intermitente. Já a situação começou a piorar no cair do dia, onde durante toda a noite até a manhã desta terça-feira a chuva caiu a catadupas.

As consequências não foram para menos, várias famílias ficaram desalojadas, perderam os seus bens, algumas dormiram de olhos fechados e outras em pé, pois a água das chuvas não passava de um delfim.

Numa ronda efectuada pela nossa reportagem na tarde desta terça-feira pouco depois de a chuva ter parado de cair, assaltaram-nos às vistas as sequelas deixadas pelas chuvas. No bairro de Khongolote, algures no Município da Matola, as ruas ficaram totalmente alagadas dificultando assim a intransitabilidade tanto de pessoas como de viaturas. Nas residências, assistia-se a um triste cenário, houve famílias que durante aquela noite chuvosa não dormiram, pois as suas residências cediam a entrada da água no interior, os quintais não passavam de uma lagoa.

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Uma chuva devastadora

Mateus Benjamim é uma das tristes faces das sequelas deixadas pelas chuvas torrenciais. A sua casa de construção precária ficou parcialmente desabada, os haveres lá dentro contidos foram arrastados pelas águas pluviais, os seus dois filhos de 3 e 5 anos de idade dormiram no colo da mãe e da irmã mais velha, enquanto estas permaneciam em pé. “A chuva entrava do tecto e do chão devido a humidade, uma vez que o chão da casa não está pavimentado, outra parte das águas vinha do interior do quintal, pois estava todo alagado”, conta para depois acrescentar que alguns bens que lhe custaram anos a fio de sacrifício ficaram destruídos, sobretudo os electrodomésticos e aparelhagens sonoras que flutuavam no interior da casa.

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Já no bairro de Khongolote que primeiramente foi concebido como zona de reassentamento para os desalojados pelas cheias de 2000 no Município da Matola, visitámos a casa de uma velha que nesse minúsculo cubículo vive com a sua neta de aparentemente 7 anos de idade. Não precisava que fosse uma forte chuva com ventos moderados a forte para o desabamento da referida casa que já estava numa posição oblíqua, deixando assim o prenúncio de uma iminente queda.

Mas quis o destino que as torrenciais chuvas desta semana deixassem ao relento a vovó Joana e mãezinha, sua neta. Quis também a ironia do destino que os parcos bens desta humilde velha fossem destruídos pelas águas, as mantas, a pequena esteira onde se deita a espera de um sono que demora vir, as suas roupas como as da sua netinha não escaparam a fúria das águas, os cadernos e outro tipo de material escolar que havia comprado para a menina que almeja ser enfermeira já deixaram de ter utilidade, mesmo antes de ser usados, pois estão sem nenhum proveito depois de absorveram águas pluviais.

“Agora eu não sei o que fazer, a minha pequena casa foi destruída pelas chuvas, os meus poucos bens e material escolar da minha neta também foram devastados pela fúria implacável das águas”, conta para depois acrescentar que hoje (terça-feira) corre o risco de dormir juntamente com a sua sobrinha a céu aberto, expostas as intempéries da mãe natureza, a não ser que apareça um vizinho para oferecer pelo menos um espaço para dormir e ver o dia passar, na esperança de reiniciar a sua vida, nomeadamente a reconstrução da sua palhota e reaver alguns bens que perdera.

Cinturão verde engolido pelas águas

No Vale do Infulene, uma zona que faz limite a oeste com a cidade de Maputo, as machambas existentes naquela zona baixa e bem abaixo do nível das águas, a situação revelou-se bastante desoladora. Os canteiros que antes apresentavam uma variedade de hortas, foram devastados pelas águas, os viveiros não escaparam a fúria das chuvas. O sentimento dos machambeiros ou dos proprietários daquelas machambas foi comum: o que fazer depois desta desgraça da mãe natureza. Todo o esforço, desde a sacha até a sementeira, empreendido nos últimos dias redundou num fracasso.

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Entretanto, já há muito que os camponeses faziam orações e pedidos para a queda da chuva, uma vez que as altas temperaturas davam cabo das culturas, não só no cinturão verde do Infulene, como também noutros cantos do país. Porque tudo por excesso prejudica, a chuva foi tão demasiada que só trouxe uma vaga de desgraças, destruindo aquilo que por um lado serve de subsistência familiar e por outro para venda.

A zona do vale do Infulene foi sempre propensa as chuvas, ciclicamente sofre os efeitos nefastos da pluviosidade, mas por se afigurar uma zona fértil e propícia para a prática da agricultura, os camponeses que usufruem das benfeitorias daquelas terras nunca arredam pé, ainda que afectados, continuam a produzir, mesmo com os riscos que correm.

Maria Saveca de 46 anos, cultiva no vale do Infulene deste o ano passado, num espaço de 20 canteiros arrendados, “para mim, esta foi uma triste experiência da minha vida, gastei muito dinheiro comprando viveiros, estrumes e outros produtos químicos para pôr na minha machamba. Mas, todo o sacrifício que fiz, redundou num fracasso, voltei à estaca zero”, comenta ajuntando de seguida que doravante não sabe o que fazer para reiniciar com o seu trabalho agrícola, cujas culturas por um lado servem para o consumo familiar e por outro para comercialização nos mercados da cidade de Maputo e Matola.

Quando Maputo muda de rosto

No centro da cidade de Maputo, ou seja, na zona de cimento, os efeitos das torrenciais chuvas dos últimos dias não foram ao mesmo ritmo que nos bairros da periferia. No bairro Chamanculo C, cuja tónica o é desordenamento territorial, procado pela falta de parcelamento, o cenário era quase que irresistível. As ruas ficaram total ou parcialmente intransitáveis, as casas construídas diga-se, de forma desordenada não passavam de piscinas e os quintais de lagoas.

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A noite de segunda para terça-feira, não foi igual as outras, muitas famílias dormiram por cima das mesas, umas em pé e outras sentadas, o mais agravante de olhos abertos, com o receio de ser engolidas pelas águas pluviais acompanhadas das libertadas pelas fossas. Aliás, existem daquelas pessoas que mesmo tendo as suas fossas cheias, esperam pela queda da chuva para abri-las e deixar toda imundice imiscuir-se nas águas pluviais em como se de águas das chuvas se tratasse. Um acto cujas consequências são de esperar, doenças diarreicas e respiratórias de tanto inalar cheiros nauseabundos e as crianças são a principal vítima que inocentemente brincam nessas águas turvas.

A nossa reportagem teve que despir de alguns preconceitos para enfrentar algumas realidades humanamente inaceitáveis. Ao longo das nossas incursões pelo bairro adentro visitámos uma casa do tipo 2 com uma casa de banho de construção precária revestida nas laterais de sacos velhos e rotos. É exactamente ali onde um agregado familiar de 6 membros cuida da sua higiene, se assim se pode dizer, pois a dita casa de banho, não passa de um espaço sem condições mínimas para exercer tal função.

A coisa mais parecida com uma pia é um buraco no chão, qual colónia de moscas e outros vermes. Os recipientes usados para tomar banho são duas latas velhas, uma de 20 litros e outra é um recipiente de leite.

INGC apela a solidariedade entra famílias

O Director-Geral do Insttiuto Nacional de Gestão de Calamidades, João Ribeiro, apelou esta terça-feira para que na sequência das chuvas que se abateram pelas cidades de Maputo e Matola e noutros pontos da região sul do país afectando dezenas de milhares de famílias, haja em primeiro a solidariedade, “é preciso que as famílias ajudem as outras necessitadas, em termos de abrigo. Também o INGC fará o seu papel que é o de conceder o reassentamento às famílias sem abrigo ou desalojadas”, aponta.

Por seu turno, a delegada do INGC da Cidade de Maputo, Fátima Belchiore, disse que na capital do país um universo de 96 famílias ficaram sem abrigo na sequência das chuvas e ventos moderados a forte que se abateram por esta parcela do país. Deste número 70 famílias são do Distrito Municipal Ka Mubukuana e 26 do Ka Mavota

No entanto, Fátima, assegurou que já foram identificados alguns locais de reassentamento para as famílias afectadas, um dos quais no distrito do Ka Mubukuana, sobretudo no circulo de Inhagoia, onde as famílias afectadas poderão ter o seu abrigo durante os próximos dias.

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