Intensos confrontos foram registrados na manhã desta segunda-feira nos arredores do complexo de Bab al-Aziziyah, quartel-general do ditador Muammar Khaddafi e um dos últimos bastiões do regime após a ofensiva rebelde de domingo em Trípoli.
Fontes rebeldes citadas pela emissora Al Jazeera informaram que blindados foram vistos a deixar o complexo e efetuando disparos. Não há informações precisas se Khaddafi está em Bab al-Aziziyah, ou sobre qual seria seu paradeiro.
No princípio da tarde desta segunda-feira o número um do Conselho Nacional de Transição (CNT), Mustafá Abdul Jalil, deu já como certa a vitória da rebelião sobre o regime de Khadafi, em conferência de imprensa que decorreu em Bengasi. Jalil agradeceu à comunidade internacional “que apoiou o povo líbio durante esta crise através das resoluções 1970 e 1973 [das Nações Unidas] e das medidas adoptadas para proteger os civis e evitar catástrofes humanas e impedir os massacres que estavam a ser perpetrados”. “Agradecemos em especial àqueles países que nos deram todo o tipo de apoio desde o nascimento desta revolução até ao momento da vitória”.
Jalil, antigo ministro da Justiça do regime e dos primeiros a abandonar Khadafi após o início dos bombardeamentos contra as manifestações pró-democracia, acrescentou no seu discurso de triunfo “Os líbios têm que compreender que o período que se avizinha não vai ser um mar de rosas. Enfrentamos muitos desafios e temos muitas responsabilidades. A começar por sanar as feridas e dar as mãos uns aos outros, numa mostra de lealdade para com o sangue derramado pelos nossos mártires”.
“O verdadeiro momento da vitória é quando Khadafi for capturado”, sublinha Jalil, que promete viajar para Trípoli assim que a cidade estiver “libertada”. O líder do CNT insistiu hoje em referir-se ao movimento contra o regime de Khadafi como feito por “revolucionários”, renegando a palavra “rebeldes”.
O líder do CNT, respondendo a perguntas na conferência de imprensa, asseverou que será feito um “julgamento justo” a Khadafi e que é “totalmente contra qualquer espécie de execução à margem da lei, independentemente dos actos cometidos contra o povo líbio e o mundo”. Jalil aproveitou também para expressar “preocupação” sobre ataques de vingança perpetrados por alguns rebeldes.
Entretanto a União Africana convocou uma reunião de emergência sobre a Líbia para ainda hoje, na capital etíope de Addis-Abeba. “O nosso principal objectivo é envolver todas as partes na Líbia, encetar o diálogo e encontrar soluções pacíficas para a situação”, explicou à agência noticiosa AFP um porta-voz da organização que, ao longo dos últimos seis meses, tentou por várias vezes negociar uma solução para a crise, mas foi sempre vista como demasiado favorável ao regime de Khadafi.
ENTRADA EM TRÍPOLI
Em Roma, o ministro italiano das Relações Exteriores, Franco Frattini, afirmou que o regime líbio controla apenas entre 10% e 15% da capital Trípoli. “Em redor do aeroporto, que é uma área chave, as últimas formas de agressão estão a ser eliminadas, atiradores estão a ser detidos e em alguns casos tem se rendido”, disse o chefe da diplomacia italiana.
Durante a noite de domingo, as forças rebeldes líbias anunciaram que possuíam o controle de grande parte da cidade de Trípoli, com exceção do complexo de Bab al-Aziziyah e de alguns “bolsões de resistência”.
Imagens das redes de TV Sky News e Al Jazeera mostravam durante a noite uma multidão de pessoas reunidas na emblemática praça Verde, no coração de Trípoli, comemorando a chegada dos rebeldes.
O local era até então um dos símbolos do regime líbio, e desde o princípio da rebelião as redes de televisão oficiais transmitiram ao vivo manifestações de partidários de Khaddafi neste local.
Os primeiros grupos rebeldes conseguiram chegar à periferia da capital líbia ainda na noite do sábado (20) e rapidamente tomaram os principais bairros da cidade, sem encontrar grande resistência por parte das forças de Khaddafi. A este primeiro grupo de rebeldes, uniram-se mais tarde os combatentes da Frente Ocidental e os comandos localizados no sul e em Misrata, que conseguiram entrar por mar na capital líbia.
Apesar do controle quase total de Trípoli, Mahmud Jibril, um dos principais membros do Conselho Nacional de Transição (CNT), alertou os combatentes rebeldes para que fiquem atentos a possíveis “bolsões” de resistência pró-Khaddafi na capital. “Devem ser prudentes. O combate não acabou. Mas, se Deus quiser, em algumas horas nossa vitória será completa”, afirmou ele, que exerce o cargo de primeiro-ministro à frente do Executivo rebelde.
MORTOS
Mais cedo, o porta-voz do regime de Khaddafi, Moussa Ibrahim, disse em entrevista coletiva exibida na TV estatal que pelo menos 1.300 morreram e 500 ficaram feridas durante os confrontos em Trípoli. Antes de lançar um último apelo ao diálogo, Moussa afirmou que a situação na capital era “dramática” e que os hospitais locais estavam cheios. “A pacífica cidade de Trípoli transformou-se num inferno por causa do apoio da NATO aos grupos de terroristas. Os bombardeios da aliança permitiram o avanço dos rebeldes, e as mortes aconteceram nesses ataques ou nos combates”, assinalou.
APELO DESESPERADO DO DITADOR
Na sua terceira mensagem de áudio divulgada pela TV estatal líbia em menos de 24 horas, Khaddafi fez um apelo a seus partidários para que tomassem armas e defendessem Trípoli “dos novos colonialistas”, em alusão aos rebeldes e à NATO. “Bela Trípoli, eles vão entrar numa cidade destruída. Imãs nas mesquitas, vocês precisam sair agora e marchar. Vão agora com as suas armas. Todos vocês. Não deve haver medo”, disse o ditador. “Temo que, se não agirmos, eles [os insurgentes] vão queimar Trípoli. Não teremos mais água, comida, eletricidade ou liberdade. (…) Vamos lá, estou com vocês até o fim. Estou em Trípoli. Vamos vencer.”
FILHOS DETIDOS
No meio da ofensiva deste domingo em Trípoli, os rebeldes anunciaram a captura de três filhos de Khaddafi. Aboubakr Traboulsi, um dos porta-vozes da rebelde Aliança 27 de Fevereiro, afirmou que dois filhos do ditador, Saif al-Islam e Saad, foram capturados enquanto estavam numa área turística da capital.
A prisão de Seif al-Islam, considerado por muitos como o sucessor do pai, foi confirmada pelo Tribunal Penal Internacional, onde ele tem contra si um mandado de prisão para crimes contra a Humanidade. Já Mohammed Gaddafi, filho mais velho do ditador líbio, entregou-se às forças rebeldes após ter sua casa cercada. Em declarações à Al Jazzera ele afirmou que recebeu garantias por parte dos rebeldes sobre sua segurança e a de sua família.