Alguns camponeses do Centro de Moçambique estão a produzir uma nova variedade de feijão bóer durante a época seca, que não só os ajuda a matar a fome, mas também contribui para a fertilidade dos solos e evitar queimadas. A isso chama-se revolução verde, mas aquela que não totalmente dependente de tractores, grandes sistemas de irrigação e extensas áreas de produção.
Essa revolução já está em curso nos distritos de Gorongosa, província de Sofala, e Sussundenga, em Manica. “Quando sacho deixo o capim na machamba e as folhas do feijão que caiem depois servem de estrume”, explicou Verónica Mico, que está a explorar uma pequena machamba de meio hectare, algures em Nhanjeia, distrito de Gorongosa.Depois da época chuvosa, ao invés de deixar as terras baldias ou plantar culturas menos tolerantes a seca, camponeses como Verónica Mico plantaram feijão bóer que agora se encontra na fase de maturação, podendo ser colhido a partir de Setembro próximo, pouco antes do início da época chuvosa.
Trata-se da variedade 0040 do feijão bóer que foi recentemente desenvolvida pelo Instituto de Investigação Agrária de Moçambique (IIAM), no âmbito de um projecto financiado pela Aliança para uma Revolução Verde em África (AGRA) em pouco mais de um milhão de dólares americanos.
Assim, na época chuvosa, os camponeses produzem as suas culturas tradicionais como arroz, batata-doce, mapira, milho, entre outras, tendo este ano começado a desenvolver esta nova variedade de feijão bóer para ser cultivada sobretudo na época seca.
Segundo Eduardo Joaquim, pesquisador do IIAM, além de contribuir para a melhoria da qualidade dos solos, esta nova variedade de feijão tem maiores rendimentos: cinco a seis toneladas por hectare, contra uma a duas toneladas conseguidas com a variedade anterior.
“Além disso, a antiga variedade local não tinha um mercado amplo devido a problemas de qualidade (relacionados com o aspecto físico e sabor) ”, disse Joaquim, acrescentando que a nova variedade tem mercado na Ásia e pode também ser comercializado tanto no mercado local em Gorongosa como no distrito de Gurúè, na província vizinha da Zambézia.
O preço do produto é encorajador. Apesar de não saberem por quanto irão vender essa nova variedade, os camponeses tem o preço da anterior variedade como referência, o que não é pouco, uma vez que o quilograma chega a atingir 40 meticais (1,4 dólar americano).
Segundo explicou o chefe da Repartição da Direcção de Agricultura e Pescas do distrito de Gorongosa, Pedro António, esta nova variedade de feijão bóer tem a vantagem de permitir que os camponeses tenham duas colheitas por ano, o que contribui para os seus rendimentos.
“Outra vantagem é que depois da decomposição dos rastilhos da planta, os solos ganham fertilidade”, explicou António.
Igualmente, esta variedade tem a vantagem de obrigar os camponeses a praticar agricultura de conservação. “Eles têm culturas durante todo o ano na machamba. Por isso, ninguém vai fazer queimadas na sua machamba porque tem culturas aqui dentro”.
Ao financiar este projecto de desenvolvimento da nova variedade de semente de feijão bóer, a AGRA pretende ajudar os pequenos agricultores a implementar a revolução verde, melhorando a sua produção, promover o acesso dos mesmos aos mercados e aumentarem os seus rendimentos.
“O que estamos a tentar fazer é que cada um dos pequenos camponeses tenha potencialidades para produzir sozinho, usar as sementes correctas, ver se a sua terra é fértil ou não, e, ao mesmo tempo, estamos a trabalhar com o Programa Mundial de Alimentação (PMA) para vermos as possibilidades de mercado”, disse Sylvia Mwichuli, directora de Comunicação e Relações Públicas da AGRA, falando a jornalistas durante uma visita de trabalho a algumas machambas no distrito de Gorongosa.
No âmbito desses objectivos, a AGRA tem vindo a trabalhar directamente com o Governo bem como com outras diversas organizações, incluindo instituições de pesquisa como é o caso do IIAM na componente de pesquisa de novas variedades de sementes melhoradas.
Depois da sua criação em 2007, a AGRA seleccionou um total de 13 países africanos onde tem operações, mas actualmente as suas atenções estão mais concentradas em quatro países, incluindo Moçambique. Além de Moçambique, os outros países prioritários nas operações da AGRA são Tanzânia, Gana e Malí.
Mas o IIAM assegura que vai continuar a apoiar os pequenos camponeses, mesmo depois da retirada do financiamento da AGRA, após os três anos da duração deste projecto iniciado em 2010.
Neste momento, o projecto já a beneficia cerca de 30 mil pequenos camponeses de Gorongosa e Sussundenga, número que o IIAM pretende aumentar até 50 mil até ao final deste ano.
Até agora, o IIAM já produziu cerca de duas toneladas de semente melhorada de feijão bóer pelo menos para o distrito de Sussundenga.
A semente é comercializada a um preço de 30 meticais o quilograma e os beneficiários directos depois beneficiam de assistência técnica durante a produção.