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Samora Machel 24 anos depois da sua morte

Samora Machel 24 anos depois da sua morte

“Não é difícil ser-se chefe de Estado, ser-se intelectual ou académico. Mas não é tão frequente ser-se guerrilheiro, combatente pela liberdade do povo. Eu permaneço “guerrilheiro”, um combatente pelos interesses do meu país e do meu povo”. Samora Moisés Machel, o “guerrilheiro”, morreu há 24 anos.

Através do livro Samora, Homem do Povo, editado pela Maguezo, Manuela Sousa Guerreiro traça o perfil do primeiro Presidente de Moçambique, figura incontornável da história de libertação de Moçambique.

Para a nova geração de moçambicanos ele é “apenas” o proclamador da independência e o primeiro presidente de um Moçambique independente. Mas o contributo de Samora Moisés Machel para a história vai mais longe.

O seu papel na libertação de África, principalmente a Austral, e a sua luta para o desenvolvimento do povo moçambicano são aspectos que não podem cair no esquecimento. Sob a chancela da editora moçambicana Magueso foi publicada a biografia “Samora, Homem do Povo”. Uma obra que, segundo Samora Moisés Machel Júnior, um dos oito filhos do primeiro presidente moçambicano, “pretende quebrar o silêncio sobre Samora Machel e permitir um debate sobre o homem e as suas ideias”.

Os primeiros capítulos do livro são dedicados aos primeiros anos de vida de Samora Machel. Do seu nascimento em Xilembene, na província de Gaza, em 1933, até à sua partida para Dar es Salaam, no início da década de 60. Como profissão o jovem Samora escolheu a de enfermeiro, “uma das poucas profissões onde se aceitavam negros”. Em Lourenço Marques “a actividade política clandestina vai ocupar grande parte do seu tempo e da sua atenção”.

Amadurecidas as suas ideias pró-independentistas, “começa incipientemente a formar uma rede clandestina de militantes onde não se discute apenas mas se realizam pequenas acções de perturbação da ordem que o colonialismo impunha nos subúrbios da cidade, onde aliás vivia. Quando surge em 1962 a notícia da criação de uma Frente de Libertação de Moçambique, liderada por Mondlane, Samora sabe já qual será o seu próximo passo: integrar a Frente”. Inicia-se então um novo capítulo na vida de Samora Machel, que rapidamente ascende a uma posição dirigente.

Com o intensificar da luta armada revela-se uma outra faceta, a de estratega militar. A qual se junta à sua natural capacidade de liderança. Com o assassinato de Eduardo Mondlane, fundador e primeiro presidente da Frelimo, e depois de um período conturbado, Samora Machel é eleito presidente da Frelimo.

“Tudo o indicava para tal tarefa: ele era o político militar concretizado, a guerra popular exigia a coincidência das duas tarefas de Direcção na mesma pessoa, ele tinha já o carisma e os modos de um chefe, era odulado pelos seus comandantes e adorado pelos militares. Quem poderia, a não ser ele, substituir Mondlane? No seio dos militares e das populaçoes das zonas libertadas não havia dúvidas de quem era o chefe. Vai assumir esse papel e vai transferir a sede da Frelimo de Dar es Salaam para Nachingwea”.

“A partir de então, Samora vai ter que viajar mais, entrar nos meandros da política exterior, procurar armas e ganhar aliados”. Por altura do 25 abril de 1974, a Frelimo encontrava-se numa situação privilegiada para obter a independência do país, a qual foi conseguida a 25 de Junho de 1975. Os anos da presidência Como presidente, Samora Machel continuou a fazer a sua guerrilha em favor do desenvolvimento do povo moçambicano.

“Em 1979, um arrojado programa de desenvolvimento é concebido com vista a arrancar o país do subdesenvolvimento em dez anos. A década de 80 é proclamada como a década da vitória contra o subdesenvolvimento, ao mesmo tempo a da construção das bases materiais do socialismo. Onde ir buscar os recursos necessários para financiar os diversos projectos?

O senado americano havia decretado, desde Setembro de 1976, a suspensão de toda a ajuda a Moçambique. A ideia era recorrer a duas fontes principais: os países socialistas e o crédito internacional”. Mas o plano falhou. “Só a história poderá, no entanto, julgar se foi o irrealismo das opções ou se a destruição engendrada pela guerra fomentada do exterior que reduziram o plano ao fracasso”. Até ao início da década de 80, a política de Samora foi “uma política de aproximação política, ideológica, militar e, pelo menos, económica com os países socialistas”.

No plano externo, a política de Samora foi, sobretudo, uma política de solidariedade com a libertação dos países africanos ainda sob domínio colonial, nomeadamente o Zimbabwe e a Namíbia. O acordo de Nkomati, em 1984 (o qual implicava o fim do apoio do Governo moçambicano ao ANC e obrigava a África do Sul a cessar o seu apoio militar e logístico à Renamo) marca um ponto de viragem na história. “O resto veio em cascata. A ida a Washington em 85, a viragem de Reagan depois de ficar surpreendido perante aquele “comunista” de África que tanto humor tinha sobre o socialismo, a primeira tentativa de assassinato do Presidente lá para Novembro de 85 no Bilene, a contínua degradação das FAM/FPLM, a quase total desresponsabilização da parte de tantos dos seus generais. Foram 85 e 86. Dois anos terríveis para o Presidente”.

A primeira parte do livro encerra com um artigo, publicado em 1996, do jornalista Carlos Cardoso. Nele, Cardoso refere o afastamento entre Samora e os dirigentes da Frelimo e o estado de espírito do presidente na altura da sua morte. ” O presidente estava cada vez mais só, lá em cima, nas nuvens ominosas da Direcção do partido, tentando manter a Frelimo do lado da sanidade e o Estado do lado da eficiência. Era o moscardo socrático, mordendo por dentro o Estado que ele tanto tentara domar”.

A 19 de Outubro de 1986 caiu, em circunstâncias ainda por esclarecer, o avião em que seguia o presidente.

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