Escritores e poetas moçambicanos na diáspora criticaram a forma como Maputo geriu os aumentos dos preços dos bens essenciais e alertaram para a necessidade de os manter congelados por tempo indeterminado para evitar novos actos de violência.
No entender de Delmar Maia Gonçalves, Jorge Viegas e Ascêncio de Freitas, só será possível “acalmar os ânimos” de uma grande parte da população moçambicana e “evitar manifestações ainda mais violentas” do que aquelas que aconteceram no início de Setembro se o Executivo mantiver, a longo prazo, a sua decisão de congelar os aumentos de produtos essenciais.
“Seria uma péssima opção terem congelado estes aumentos para daqui a um mês voltarem à carga com a mesma ideia. Se o fizerem, não sei se os moçambicanos não vão voltar a reagir de forma violenta, e penso que será mais grave porque poderá acontecer no país inteiro”, alertou o poeta e escritor Delmar Maia Gonçalves.
Falando à margem do 3º encontro de escritores moçambicanos na diáspora, que decorreu semana passada em Lisboa, o curador desta iniciativa criticou a forma como Maputo geriu toda a situação, lembrando que aos moçambicanos “já são pedidos sacrifícios há muitos anos e as pessoas apenas aguentam até um certo ponto”.
No início deste mês, a manifestação popular contra o aumento do custo de vida em Moçambique resultou em confrontos entre populares e a Polícia que se saldaram em 18 mortes (segundo fontes clínicas, o Governo só reconhece 14) e centenas de feridos e detidos.
Apesar de não concordar com a forma como muitos expressaram o “seu descontentamento e desespero”, Maia Gonçalves disse perceber essa “fúria”, numa altura “em que muitos já não têm por onde se aguentar”.
“Obviamente que a situação foi aproveitada por delinquentes, mas não podemos meter todos no mesmo saco: de facto houve ali muitas pessoas trabalhadoras que se manifestaram de forma genuína para exigirem justiça”, frisou.
Para o escritor moçambicano Jorge Viegas a pobreza no país não pode ser combatida “apenas levando os moçambicanos a apertarem o cinto e a trabalharem mais, sobretudo quando o Governo continua a gastar a riqueza gerada de forma supérflua”.
“As pessoas, quando se sentem humilhadas e vêem uma coisa que as penaliza ainda mais, reagem sem pensar e facilmente podem ser influenciadas a cometerem determinados actos”, alertou.
A existência de uma “espécie de novo riquismo no país e, sobretudo, o seu exibicionismo por parte de dirigentes políticos e empresas agravam ainda mais esta situação”, destacou Jorge Viegas.
Já o jornalista, escritor e poeta luso-moçambicano Ascêncio de Freitas afirmou não perceber como é que “uma pessoa inteligente como o Presidente Guebuza, que é um bom negociador, caiu na idiotice de autorizar um aumento daquilo que é essencial”.
“Não sei como é que se fez uma estupidez daquelas: a fome é tal em algumas regiões que não se pode aumentar aquilo que é essencial para alimentar os filhos”, criticou Ascêncio de Freitas, para quem houve “uma clara falta de previsão das consequências da medida” por parte do Governo.