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‘@ a ntyiso wa wansati -Pequenos Gestos

Não nasci com asas, mas o céu já era meu quando virava a cabeça e o avistava por entre as árvores. A minha mãe diz que aprendi a subir às árvores mesmo antes de começar a andar: ainda gatinhava quando os meus pais apanharam o primeiro susto.

Eu subia às árvores com a minha irmã Matilde, ficávamos horas e horas escondidos lá em cima a espiar o mundo, enquanto os outros miúdos tentavam subir ou se conformavam em trepar árvores mais baixas. Gostávamos de nos pendurar nos ramos e de ficar a balançar para a frente e para trás como se fosse um trapézio. Por vezes saltávamos de uns ramos para os outros, tal e qual como faziam os macacos que vinham ao nosso terreno roubar fruta das árvores.

Eu perseguia-os por entre os ramos e eles pareciam rir-se na minha cara. Ou talvez pensassem que eu era um macaco como eles, apenas de uma espécie diferente, da espécie que usa calções e vai à escola. O meu pai lia muito, ao serão, depois do jantar. Romances e livros de filosofia. A filosofia sempre foi a sua paixão.

A filosofia e o mar. De manhã cedo, via-o a sair para praia com a prancha de surf debaixo dos braços. Durante as férias, aos fins-de-semana ia com ele, e foi assim que aprendi a fazer surf ao mesmo tempo que coleccionava letras e números. O mar e o céu vivem de mãos dadas no horizonte.

São como siameses que o universo separou para que a terra pudesse existir. Sou mais feliz dentro de água ou acima da terra, e por isso decidi, no cimo das árvores que um dia ia ser piloto e sobrevoar o mundo. Sempre quis viajar, conhecer todos os continentes, aprender várias línguas, viver em muitas cidades até descobrir um lugar perfeito onde o mar e o céu se encontrem sempre com o meu olhar.

Uma terra tranquila sem guerras e com sol, um segredo escondido que não venha em nenhum mapa e onde não tropece em turistas de chinelos caros e chapéus de palhaço rico. O que eu nunca pensei, minha pequena fada que me esperas ao final da tarde numa casa branca cujas janelas se encontram com o horizonte em que os siameses se juntam, é que posso voar em terra e mergulhar nas ondas sempre que te vejo, posso chegar ao céu sem ligar os reactores e deslizar sobre as águas com a perfeição dos pequenos gestos.

Não sei se é a isto que os deuses chamavam amor, mas cada vez que chego e tu me abres o portão para me deixar entrar no teu corpo e no teu coração, sinto que todos os elementos estão sob o mesmo tecto. O teu corpo é como uma concha, o teu olhar como um rio; os teus braços uma ilha e o teu peito a minha casa.

Não sei de que é feito o amor, nunca descobri o seu segredo, mas sei que ando lá perto, que perto de ti, nos mais pequenos gestos, há uma espécie de amor que transpira no ar e transborda como uma onda e que me atira para aquele lugar perfeito que só existe no meu coração.

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