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Petróleo: Um presente eternamente envenenado?

O anúncio efectuado na passada segunda-feira pelo Governo moçambicano confirmando a existência de petróleo na bacia do rio Rovuma, na província nortenha de Cabo Delgado, provocou uma enorme onda de euforia no país. Já só oiço falar em milhões e biliões de barris/ano e as acções da Cove Energy, empresa que detém uma posição de 8,5% no bloco de exploração, dispararam 14% na bolsa de Londres. E, quando se sabe que a certificação de existência vem dos americanos da Anadarko Petroleum – empresa norte-americana que desde 2006 faz prospecção de ouro negro naquela zona do país –, não há hipótese de a coisa cheirar a esturro.

Quarta-feira de manhã veio a confirmação que faltava: o petróleo descoberto nos furos é comercializável. Urra, urra, agora é que vai ser! Só nos faltava mesmo o petróleo para sermos um país ainda mais rico e, sobretudo, independente. Sim porque com o nosso potencial agrícola, pecuário, pesqueiro, mineral, e, agora, petrolífero, só podemos ser um grande e rico país.

Confesso, todavia, que no meio de todo este regozijo, vieram-me à memória três lembranças: uma frase de Oliveira Salazar, as palavras de Renato Ndongo e a comédia portuguesa intitulada “Há petróleo no Beato” com o saudoso Raul Solnado como principal intérprete.

Em relação à primeira, diz-se que quando, nos meados de ´60, os assessores do velho ditador português vieram, eufóricos, dar-lhe a notícia de que havia sido descoberto petróleo em Angola, este desconcertou-os afirmando: “Só me faltava mais esta!” Infelizmente, o tempo veio dar razão ao homem de Santa Comba Dão e hoje, 44 anos depois, o povo angolano não é mais feliz com o ouro negro, antes pelo contrário.

Em relação à segunda lembrança, as palavras do guinéu-equatoriano Renato N’dongo numa recente conferência a que tive oportunidade de assistir subordinada ao tema “Petróleo e África: O caso da Guiné-Equatorial”, não são as mais animadoras.

Segundo este escritor e académico natural da Guiné-Equatorial, exilado em Espanha por razões políticas, a exploração de crude no seu país, iniciada nos anos ´90, só veio trazer mais repressão política – o Presidente Obiang não tem de dar satisfações a ninguém –, mais corrupção e mais desigualdades, alargando cada vez mais o fosso entre miseráveis – 60% da população vivem com menos de 1,5 dólar/dia – e milionários – Obiang está entre os 20 homens mais ricos do mundo.

A terceira lembrança, a do filme “Há petróleo no Beato”, conta-se em poucas palavras: Juvenal Costa é um humilde taxista que mora com a família no bairro lisboeta do Beato. Vive numa casa minúscula, com a mulher e a filha e enfrenta enormes dificuldades económicas, estando mesmo em risco de perder o táxi por não ter dinheiro para pagar as prestações.

Um dia, a mulher vai apanhar uma alface para enganar a fome e dá-se o inesperado: de um buraco na terra jorra petróleo. O furo revoluciona tudo. Juvenal já se considera rico, os poderes nacionais e internacionais querem dialogar com ele, torna-se famoso e é assediado por todo o lado. A sua vida, até aí humilde mas pacata, transforma-se, vivendo no meio de intrigas, invejas e assédios. A sua felicidade é ilusória.

Com estas lembranças, muitos dir-me-ão que estou a ser demasiado pessimista e apóstolo da desgraça, mas se olharmos para os três maiores países africanos produtores de petróleo – Angola, Nigéria e Guiné-Equatorial, a ordem é mesmo esta – parece-me que realismo é a palavra que melhor se aplica ao meu ponto de vista. Efectivamente, não restam dúvidas de que estes três países estão longe de poderem ser considerados réussites, (conseguidos, no sentido de bem sucedidos) como dizem os franceses. Neles a descoberta de ouro negro não passou de um presente bem envenenado. Agora cabe a nós, moçambicanos, contrariar este tendência negativa. Esperemos conseguir.

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