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Xïkwembo: Desaparecida, viajaste?

Sim, viajei.

Porque moçambicano não se desloca em trabalho, não faz férias, não sai no fim-de-semana. Não, moçambicano viaja – só, seja a deslocação intercontinental, para o estrangeiro, para as províncias ou apenas para fora da cidade de Maputo.

Viajamos para o estrangeiro e viajando ele é outro. No estrangeiro tudo é diferente.

No estrangeiro moçambicano bebe água de coco, mas é porque é mais fresca.

No estrangeiro caminha na calçada da marginal, mas é porque é mais limpa.

Exercita o corpo mas porque é moda que todo o mundo segue.

Paquera a mulata, porque ela aqui é estrangeira.

Fotografamos.

– Ei, deixa ela tirar as fotos, ela é fotogénica.

– Mas…

– Sim, tira boas fotos, deixa ela fotar.

Sim, moçambicano é fotogénico.

Todos sabemos moçambicano não gosta muito de horários, mas a verdade é que o avião não voa aquela hora das 17. Voa a hora exacta, precisa, sem esperar por ninguém, sem querer saber dos problemas de transporte, de família, de rancho ou de malária. Por isso moçambicano em viagem sofre.

Chegamos ao aeroporto e aqui em casa os conhecimentos ajudam, agilizam, facilitam. A sala de check in está lotada mas facilmente se comunica com o brada ao balcão e com a connection na direcção, aqui em casa não há problemas.

Mas fora do ritmo descontraído de Maputo o caso já é diferente, chegamos a Lisboa e atrasamos no tempo. Depois de várias tentativas finalmente estamos todos, todas as malas, os passaporte, os bilhetes. Mas somos muitos. E sempre algum de nós quer ir; comprar revista, tomar água, ir ao banheiro, fazer chamada, paquerar estrangeira. Mesmo depois de longas esperas e depois de todos prontos na sala de check in ainda falta algo. Moçambicano desconfia de aeroportos, de funcionários, de transporte de malas e scanning de sacos – moçambicano não leva saco assim desprotegido, nu. Nada, Moçambicano “emplastica”.

Ok, depois de 40 minutos e seis malas enroladas em plástico cor de laranja estamos prontos. Estamos sentados frente ao painel de check in, aparentemente pouco alerta para o facto de que estar ali não adianta muito, é preciso fazer o check in! E só passado quase uma hora de papos e estórias sobre a política, os teatros e as autoridades de Moçambique só aí nos apercebemos de que é melhor avançar. Avançamos. No balcão, na habitual formulação frásica formal de Portugal, com cara fechada somos admoestados como crianças:

– Meus senhores gostaria apenas de alertar para o facto de que o horário limite para o check in é uma hora antes, têm agora sete minutos para o fazer.

Embora o funcionário até tivesse razão não pude deixar de notar que nem todos foram tratados desta forma… e que mesmo eu, inserida neste grupo, recebi um sorriso.

E como viajamos em grupo em geral um de nós leva todos os documentos, que entrega juntos, identificando depois cada um de nós à medida que passamos. E não pude deixar de notar que invariavelmente consideram que eu estou no grupo errado. E isto eu não entendo, porque acham que isso de se moçambicano, em Moçambique ou no estrangeiro, se distingue na cor?

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