A decisão do presidente Hamid Karzai de assumir o controle do principal organismo de vigilância eleitoral do Afeganistão provocou a consternação de diplomatas e analistas, que viam a redução das possibilidades de eleições livres. O presidente Hamid Karzai mudou a lei para assumir o controle da Comissão de Queixas Eleitorais (ECC), um organismo que desconsiderou mais de meio milhão dos votos atribuídos a ele nas eleições do ano passado denunciados como fraudulentos.
A emenda permite a Karzai nomear os cinco membros da ECC. Na legislação anterior, três membros foram designados pela Missão de Assistência da ONU no Afeganistão. O ex-representante da ONU no Afeganistão Peter Galbraith considerou que o Ocidente deverá condicionar sua ajuda financeira até que a ECC recupere a composição anterior. “A comunidade internacional deverá insistir para que a comissão eleitoral seja realmente independente, e não nomeada por ele”, disse à BBC Galbraith, que deixou o cargo após as eleições fraudulentas do ano passado.
“Se a ECC não tem mais três de seus cinco membros nomeados pelas Nações Unidas, não devemos pedir aos contribuintes dos Estados Unidos e de outros países que paguem por eleições falsas”, acrescentou. A segunda eleição presidencial na história do Afeganistão, realizada no mês de agosto, foi denunciada como uma farsa e mergulhou o país em uma crise política durante meses, até que Karzai foi declarado presidente pela Comissão Eleitoral Independente (IEC) e voltou a ocupar seu posto a partir de novembro. A eleição custou cerca de 300 milhões de dólares às Nações Unidas e a ECC cancelou cerca de um terço dos votos a favor de Karzai – meio milhão de cédulas – por fraude.
A decisão levou à convocação de um segundo turno, que foi cancelado quando o outro candidato, Abdullah Abdullah, se retirou, acusando a IEC, também nomeada por Karzai, de ser parcial. Abdullah pediu nesta quarta-feira que a comunidade internacional “pressione (o presidente Karzai) para que realize um processo transparente”. “Espero uma mudança concreta na forma como a comissão eleitoral (IEC) é nomeada e no sistema eleitoral”, declarou em Paris.
O decreto aprovado na semana passada também provocou críticas no país. O analista político Ahmad Sayedi considerou que “compromete completamente a natureza democrática e independente de ambos os organismos”. “A ECC já não será independente”, acrescentou. O porta-voz de Karzai, Siamak Herawi, justificou a iniciativa ao ressaltar que se trata de assegurar que a ECC seja um organismo realmente afegão. “Com estrangeiros na comissão não se tratava de um organismo nacional nem afegão. Então, para ‘afeganizar’ o processo, o presidente mudou alguns artigos da lei”, disse Herawi à AFP na terça-feira.
“Alguns artigos da lei recebera emendas e o presidente assinou e aprovou”, disse Herawi. Perguntado sobre quem nomearia para o novo painel segundo a nova lei, respondeu: “o presidente”. O governo afegão adiou para setembro as eleições legislativas originalmente previstas para maio, entre pedidos de reformas eleitorais e preocupação com a corrupção crescente.
A Grã-Bretanha, com 9.500 tropas no Afeganistão, pediu a Cabul que garante a independência dos organismos eleitorais. “Continuaremos trabalhando com as Nações Unidas e com o governo afegão para dar todos os passos necessários para ajudar a constituir instituições eleitorais afegãs independentes”, disse um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores.